Entrevista 14/04/2024 18:10

Morris Pearl: “A maioria das pessoas sequer tem ideia do que é ser rico”

Líder do Patriotic Millionaires, grupo de super-ricos que querem pagar mais impostos, Pearl defende a criação de um sistema tributário global unificado e mecanismos de redistribuição da riqueza

Na abertura da primeira reunião financeira do G20, em fevereiro, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, defendeu a criação de uma tributação progressiva para bilionários.

Em 2024, o Brasil preside a 19ª reunião de cúpula do grupo formado por ministros de finanças e chefes dos bancos centrais das 19 maiores economias do mundo, além da União Africana e da União Europeia.

O país colocou como prioridades da agenda a inclusão social e a reforma das instituições de atuação global. Segundo Haddad, o governo aproveitará a presidência para propor temas como a tributação de empresas que operam em vários países e o imposto sobre heranças.

Líder da Patriotic Millionaires, organização que reúne super-ricos estadunidenses que pedem a taxação de suas fortunas, Morris Pearl elogiou o esforço brasileiro no G20. “Penso que seria uma vitória para todos se houvesse um sistema mais unificado. Se tivéssemos as mesmas taxas de impostos, as pessoas ainda poderiam se mudar ocasionalmente para outros países”, analisa Pearl, que foi executivo da BlackRock, uma das maiores gestoras de investimentos do mundo.

“Mas eles não vão ter toda essa indústria de especialistas em evasão fiscal. E alguns dos países que são menos ricos terão mais dinheiro, porque poderão cobrar mais impostos.”

O milionário, que reclama do fato de praticamente nunca ter pagado impostos na vida, aponta alguns dos principais mitos que envolvem o tema, como a necessidade de encorajar investimentos ou fomentar empregos.

“Não acredito que as pessoas vão deixar de investir dinheiro só porque, se investirem, terão que pagar impostos. A maioria prefere ser rica e pagar alguns impostos do que não ser rica”, pontua.

“E a noção de que, se você cobra impostos de alguém, essa pessoa terá que pagar menos a outra pessoa para compensar a diferença, não é correta.” Na visão de Pearl, há problemas que só podem ser resolvidos com a cobrança de taxas — a desigualdade é o principal deles. E, ao usarem suas fortunas para interferir na política fiscal reclamando de impostos, os mais ricos acabam interferindo na própria lógica da democracia.

“Precisamos ter impostos e depois fazer o povo, através dos seus representantes eleitos, decidir o que deve ser feito com o dinheiro”, defende.

Ele afirma também que o sistema ideal faria cada pessoa pagar impostos com base em quanta riqueza possui, com taxas progressivas. A seguir, ele fala sobre por que considera a causa tão urgente para a justiça social, as consequências da desigualdade tributária e as possíveis soluções para o problema.

Você é um ex-executivo da BlackRock e agora defende políticas fiscais mais justas. O que o levou a essa causa?

Tenho 64 anos, já vivi um bom tempo e vi o que acontece quando há uma grande desigualdade no mundo. Lembro-me do apartheid na África do Sul e como os protestos não terminaram bem para os ricos. Estive em Atenas, na Grécia, há pouco mais de dez anos, e lembro que um dia pensei que estava vendo um desfile. Depois percebi que era algo entre um protesto e um motim descendo a rua em direção ao local onde o parlamento se reunia. Preferiria não viver como as pessoas viveram na África do Sul na década de 1980 ou na Grécia há dez anos. A América Latina também teve problemas.

Tive a sorte de poder deixar de trabalhar pouco depois daquele incidente na Grécia. Decidi que tinha feito tudo o que precisava pelos acionistas da BlackRock e tenho feito esse trabalho de defesa de direitos e políticas mais ou menos em tempo integral desde então. Imagino que posso fazer mais mudando as políticas da nossa nação [os Estados Unidos] para ajudar meus filhos, e agora a minha neta, do que ganhando mais US$ 1 milhão para acionistas.

Você poderia ter escolhido outras causas. Por que considera a desigualdade de impostos uma questão tão urgente?

É algo muito visível para mim. Para ter ideia, vivo há dez anos de investimentos e pago uma fração da taxa de imposto que as pessoas que trabalham para viver aqui nos Estados Unidos pagam. No decorrer do meu trabalho e da minha vida, tomei consciência de muitas questões sobre como funcionam os impostos. Então, claro, eu poderia falar sobre prevenção da violência armada, saúde pública, escolas para crianças ou muitas outras coisas, mas tenho alguma experiência na área financeira. Sei muito sobre impostos e hipotecas, por isso optei por tentar contribuir para o discurso público em uma área onde realmente posso contribuir.

Você mencionou que poderia estar defendendo a educação sobre o controle de armas. Como a desigualdade tributária intersecta comoutras questões de justiça social?

As pessoas que são contra os impostos são contra o governo fazer coisas. E sou a favor de que o governo faça coisas. As pessoas se mudam para Nova York, apesar de ser um dos locais com impostos mais elevados do nosso país, porque temos um estado com uma economia vibrante onde as pessoas podem abrir novos negócios.

As pessoas não estão se mudando para as regiões com os impostos mais baixos do país. Alguns até mudam quando querem se aposentar, mas os jovens que desejam abrir negócios estão indo para locais com impostos elevados, e não para regiões com impostos baixos. Acho que a maioria das pessoas quer viver num lugar onde o governo cobra dos ricos dinheiro suficiente em impostos para pagar coisas como escolas, hospitais e parques.

“Acho que a maioria das pessoas quer viver num lugar onde o governo cobra dos ricos dinheiro suficiente em impostos para pagar coisas como escolas e hospitais”
— Morris Pearl analisa o impacto de tarifas tributárias na economia nacional e global

Qual o papel da cooperação e da coordenação internacional no combate à desigualdade tributária, especialmente no contexto das economias globalizadas?

Cada país tem seu próprio sistema tributário em sua maior parte. Mas, para o bem ou para o mal, as pessoas podem mudar de um país para outro com bastante facilidade hoje em dia. Não que todo mundo faça isso. Honestamente, não creio que nosso maior problema aqui seja a mudança de pessoas. Mas em muitos lugares, como a União Europeia, a América do Sul e a América Central, as pessoas se mudam para outras cidades.

Dizem que as pessoas estão escondendo dinheiro no Panamá ou em Liechtenstein, e digo que elas não precisam escondê-lo, pois são perfeitamente abertas sobre isso. Não está escondido — elas saíram do país para não pagar impostos.

Penso que, se tivéssemos as mesmas taxas de impostos, as pessoas ainda poderiam se mudar ocasionalmente para outros países. Mas eles não vão ter toda essa indústria de especialistas em evasão fiscal. E alguns dos países que são menos ricos que os Estados Unidos terão mais dinheiro, porque poderão cobrar mais impostos.

Seria uma vitória se tivéssemos um sistema mais unificado em todo o mundo. Não estou dizendo que isso vai acontecer, mas agradeço o esforço do povo brasileiro nas reuniões do G20. Talvez os jovens sejam mais idealistas, mas desejo progresso.

O que você pensa sobre mecanismos de redistribuição da riqueza, como renda básica universal ou impostos sobre herança?

Sou a favor de ambos. No Alasca, eles têm uma forma de renda básica universal para os nativos, as pessoas que vivem lá, basicamente porque o governo obtém muitos rendimentos com seus recursos naturais. Existem modelos semelhantes em alguns países do Oriente Médio. Acho que isso é bom, porque a parte da desigualdade que mais me preocupa é a probreza, um grande número de pessoas sem esperança. Pode haver pessoas marchando nas ruas com forcados ou iniciando um motim. Isso é o que eu gostaria de evitar.

E sou a favor de tributar o dinheiro que você herda da mesma maneira que tributamos o dinheiro que você ganha de qualquer outra forma. Não vejo nenhuma razão para que os herdeiros devam ter uma isenção de impostos que os trabalhadores não têm. Se você recebe dinheiro do seu trabalho e paga uma certa quantia de impostos sobre isso, por que alguém que não trabalha, mas recebe dinheiro da família, não deveria pagar pelo menos a mesma quantia de impostos que os trabalhadores? Não é como se tivéssemos que incentivar as pessoas a herdar.

Pelo menos no Brasil, questões que exigem intervenções políticas se tornaram muito polarizadas. Por exemplo, se você defende mais impostos, pode ser retratado como comunista. Quais são os riscos de politizar ou polarizar assuntos como esse?

É para isso que serve a política, para as pessoas tomarem decisões votando. Sou a favor de que as pessoas discutam essas coisas e votem em quem fará isso. E se todos votarem, talvez tenhamos políticas que sejam boas para a maioria das pessoas. Parte do nosso problema aqui [nos EUA] é que nem todos votam. E as pessoas com mais dinheiro têm mais influência política, porque gastam seu dinheiro em anúncios e coisas assim. Essas coisas deveriam ser politizadas, porque esse é o trabalho dos políticos. Em alguns casos, os rótulos podem ser “bom” ou “mau”, “comunista” ou não.

Não, não sou a favor de um sistema comunista como foi feito na Rússia nas décadas de 1960 e 1970 ou de um sistema econômico como o da Venezuela nas últimas décadas. Mas sou a favor de políticas que são frequentemente chamadas de socialistas. Embora, se você usa a palavra socialista, as pessoas pensam que isso é mau, porque os ricos lhes disseram que isso é mau. Os ricos disseram que partilhar é ruim.

“Sou a favor de políticas chamadas de socialistas. Embora, se você usa essa palavra, as pessoas pensam que isso é mau. Os ricos disseram que partilhar é ruim”
— Pearl se posiciona sobre a politização do debate em torno da taxação de fortunas

Muitas pessoas que são ricas pensam que de alguma forma são merecedoras. Deus decidiu que elas deveriam ser ricas e estamos interferindo na obra de Deus se ajudarmos alguém a ficar rico. Eu não concordo com essa teoria. Sou a favor de certas políticas; se você quiser rotulá-las de liberais, progressistas, socialistas ou o que quer que seja, ok, isso é um rótulo. Mas acho que você tem que ir um pouco além do rótulo e dizer se é contra ou a favor, e não apenas tomar uma decisão com base em ser contra políticas só porque foram defendidas por alguém que você não gosta.

Na sua visão, quais os efeitos e as consequências práticas da desigualdade tributária?

Quando as pessoas que trabalham para viver ganham dinheiro, os impostos são deduzidos do salário: 20%, 30%, 40%, o que for. Portanto, elas têm menos do que ganham para poupar. Por outro lado, alguém como eu, que não trabalha muito, não paga impostos sobre tudo o que ganha com investimentos. Posso sacar dinheiro de minhas contas de investimento sem ter que pagar nenhum imposto, porque o principal imposto aqui nos EUA é o de renda.

Essa é uma das vantagens de ser rico: você não precisa de renda. Se eu conseguir ganhar dinheiro no mesmo nível que alguém que trabalha para viver, posso economizar muito e, no ano seguinte, ganhar ainda mais dinheiro. Minhas economias aumentam de uma forma que a dos trabalhadores simplesmente não aumenta.

Olhei para meus investimentos recentemente e tenho tanto valor agora como há dez anos. Isso porque consigo economizar muito do que ganho. E a razão é porque não tenho de pagar impostos. Mesmo quando tenho o que chamamos de ganhos relativos, pago impostos em uma porcentagem muito inferior do que uma pessoa que trabalha. É por isso que, nesse sistema tal como está estruturado nos Estados Unidos, e até em outros países, os ricos tendem a ficar cada vez mais ricos, enquanto as pessoas que realmente trabalham têm de trabalhar arduamente apenas para sobreviver e não têm a oportunidade de aumentar sua riqueza como eu tenho.

Mas você teve que pagar impostos inicialmente, quando estava ganhando uma renda e aumentando essa riqueza?

Sim e não. Sim, eu tinha salário e pagava impostos, mas nos anos em que trabalhei, grande parte da minha remuneração veio na forma de opções de ações. Portanto, o valor da renda sobre a qual paguei impostos é uma fração da quantidade de dinheiro que tenho agora. Enormes quantias do meu dinheiro foram para fundos onde os impostos são adiados entre alguns anos e para sempre, preferivelmente para sempre.

Além disso, herdei parte do dinheiro que tenho. Ninguém nunca pagou impostos sobre esse dinheiro também. A herança não faz parte da definição de renda aqui nos Estados Unidos. Então, não é como se eu estivesse gastando dinheiro depois dos impostos. É como se a maior parte da renda que ganhei nunca tivesse sido tributada.

“Herdei parte do dinheiro que tenho. Ninguém nunca pagou impostos sobre esse dinheiro também”
— O bilionário explica como acumulou riqueza pagando poucos impostos

Você acha que esse é o caso da maioria das pessoas ricas e milionárias?

Com certeza. Vemos as notícias sobre pessoas mais ricas, como Jeff Bezos, que pagam quase zero imposto. A razão disso é que elas têm renda quase zero. E isso não deveria ser um choque — se você é bilionário, não precisa de nenhuma renda. Às vezes recebo perguntas do tipo “como Mark Zuckerberg sobrevive com um salário de US$ 80 mil por ano?” Bem, ele não sobrevive; ele recebe US$ 80 mil por ano em salário, além de algumas centenas de milhões de dólares por ano quando vende suas ações ocasionalmente.

Então, acho que a maioria das pessoas sequer tem ideia do que é ser rico. Elas pensam que uma pessoa rica é alguém que tem um salário alto; que a pessoa rica é a estrela do futebol que recebe US$ 1 milhão por temporada ou algo assim. Não, aquela estrela do futebol não é rica. O dono do time de futebol pode ser rico.

Você acha que hoje é possível realmente trabalhar para se tornar um bilionário ou milionário?

Há cem anos, poucas pessoas conseguiam; e poucas conseguirão daqui a cem anos, independentemente do sistema fiscal. Alguns acreditam que basta trabalhar duro para isso. Não é verdade que todos os que trabalham arduamente se tornarão bilionários, mas é verdade que algumas pessoas se tornarão bilionárias, e que aquelas que trabalham arduamente têm mais chance do que qualquer outro de se tornarem bilionárias. Mas, no fundo, acho que a probabilidade é maior se você comprar bilhetes de loteria.

Um dos maiores argumentos contra o aumento dos impostos sobre os ricos é que isso poderia levar à fuga de capitais ou desencorajar o investimento em empreendimentos produtivos. Como garantir que as políticas fiscais sejampensadas para promover tanto o crescimento econômico como a equidade social?

Acho que as pessoas não tomam decisões sobre onde morar com base apenas nos impostos. Embora, claro, aqui mesmo em Nova York, alguns dos nossos líderes políticos tenham medo da fuga de capitais e dizem que, se aumentarmos os impostos, os ricos vão embora. Temos algumas dezenas de pessoas que são realmente ricas e pagam muitos impostos. E se um deles se mudar? Um deles [o ex-presidente Donald Trump] se mudou para Mar-a-Lago há alguns anos, e estou bem com isso.

Os impostos não desencorajam os investimentos. Posso decidir que não gosto de impostos, que quero entrar em greve e manter todo meu dinheiro em espécie e pegar uma grande caixa com notas de US$ 100 e guardá-las no meu armário. Então pagarei zero imposto, mas também terei retorno zero sobre meus investimentos.

Isso não é uma coisa lógica para alguém fazer. Suponho que, se você for apenas religiosamente contra os impostos, poderia fazer um voto de pobreza e virar padre e não ganhar nenhum dinheiro. Então, não acredito que as pessoas vão deixar de investir dinheiro só porque, se investirem, terão de pagar impostos. Nunca ouvi ninguém dizer que estava pensando em abrir uma empresa e se tornar um bilionário, mas depois descobriu que teria que pagar impostos e achou melhor nem tentar. A maioria das pessoas prefere ser rica e pagar alguns impostos do que não ser rica.

Quais você considera outros equívocos ou mitos comuns sobre a desigualdade tributária?

Penso que muito se resume ao fato de encorajarmos investimentos, o crescimento de empregos, isso ou aquilo. Mas temos impostos mais baixos sobre pessoas com rendimentos de investimentos, ou mesmo gestores de investimentos, do que sobre pessoas que trabalham. E não é que faltem indivíduos que queiram investir ou se tornar gestoras de fundos.

Se quisermos encorajar as pessoas a procurar determinados empregos, eu concederia impostos mais baixos, por exemplo, a enfermeiros ou professores. Não vejo falta de pessoas que querem se tornar gestoras de investimento ou investidoras, e não vejo necessidade de encorajar mais pessoas a seguirem nesse ramo. O argumento de que temos de ter taxas de impostos mais baixas para os ricos para encorajar as pessoas a serem ricas é ridículo.

Que papel grupos como o Patriotic Millionaires desempenham na formação do discurso público e na influência de decisões políticas relacionadas com a desigualdade fiscal?

Todos os membros da nossa organização são pessoas ricas. Muitos estão envolvidos com política e coisas assim. E muitos deles conhecem nossos líderes políticos. Parte do problema do nosso país é que nossos líderes políticos têm de gastar muito tempo arrecadando dinheiro. Quase todos os dias recebo mensagens de que algum congressista quer falar ou se encontrar comigo.

Nossos congressistas conhecem nossos ricos, e pelo menos alguns dos ricos e alguns dos congressistas se conhecem muito bem porque passam muito tempo juntos, o que é parte do problema. Mas poderíamos tentar tirar vantagem disso. Então tentamos fazer nossos membros explicarem ao povo do Congresso que não queremos impostos mais baixos; queremos menos desigualdade, para que nossos filhos e netos também tenham as oportunidades que tivemos para enriquecer. Portanto, uma das coisas que pedimos aos nossos membros é que aproveitem sua relação com líderes políticos e defendam essas medidas.

Se dependesse de você criar um novo sistema tributário, o que faria?

Penso que faria cada pessoa pagar impostos com base em quanta riqueza ela possui — seja do trabalho, da herança, dos seus investimentos. Colocaria todas as fontes de dinheiro em pé de igualdade aos olhos das autoridades fiscais. E diria que pagaremos taxas e valores mais elevados conforme a riqueza.

Talvez nada nos primeiros US$ 40 mil ou nos primeiros US$ 100 mil se você tiver muitos filhos. Mas então faria as taxas subirem cada vez mais para que, talvez no segundo bilhão, cobrássemos das pessoas impostos de 70% ou 80%; ou 90%, se o país estiver indo muito bem. Até porque pagar 90% dos impostos sobre o segundo bilhão não te desencoraja de ganhar o primeiro.

E por que ainda não se faz isso?

Porque nosso processo político foi, em parte, capturado pelos ricos que não querem pagar mais impostos. E as pessoas acreditam que impostos matam empregos. Muitos jovens do partido republicano, o lado mais conservador, pensam que a forma como os empresários trabalham é a seguinte: você vê quanto dinheiro ganha com a venda do produto; aí, decide quanto quer levar para casa no final e então diz “ok, qualquer que seja a diferença, um pouco vai para os salários dos trabalhadores, um pouco para comprar produtos e o restante para pagar impostos.” Então, aumentando os impostos, os salários dos trabalhadores teriam de diminuir.

Mas não é assim que funciona. O empresário ganha uma certa quantia com a venda de seu produto. Ele paga aos trabalhadores exatamente o suficiente para fazê-los trabalhar. Então ele subtrai os impostos do que sobrou e fica com o restante.

A noção de que, se você cobra impostos de alguém, essa pessoa terá que pagar menos a outra pessoa para compensar a diferença, não é correta. E existe essa crença de que se você cobrar impostos dos ricos, eles vão parar de gastar dinheiro porque não querem ser menos ricos. Pode ser verdade que eles não queiram ficar menos ricos, mas não é que não pagar impostos vá ajudar.

“Não creio que seja certo que algumas pessoas ricas tomem todas as decisões sobre como o dinheiro será gasto. Não é isso que queremos dizer com democracia”
— Pearl considera que a filantropia não resolverá todos os problemas ligados à desigualdade

E por que é tão importante falar sobre impostos e não apenas sobre filantropia ou doar seu dinheiro?

Eu poderia doar meu dinheiro, e doo parte dele, mas isso não resolverá o problema da desigualdade. E nem qualquer forma de filantropia resolverá. Há muitos problemas pelos quais temos impostos que não podem ser resolvidos com filantropia. Poderia facilmente arrecadar muito dinheiro se quiséssemos construir uma sala de concertos e colocar o nome de alguém nela. Isso é bom, mas não resolve todos os problemas. Também preciso de um centro de tratamento de esgoto na rua 143; de escolas em bairros onde vivem pessoas pobres e ninguém se importa com o nome que está na escola; que estradas sejam reparadas. E quero que essas decisões sejam tomadas democraticamente pelos eleitores, a partir de representantes eleitos.

Não creio que seja certo que algumas pessoas ricas tomem todas as decisões sobre como o dinheiro será gasto. Não é isso que queremos dizer com democracia. Precisamos ter impostos e depois fazer o povo, por meio de seus representantes eleitos, decidir o que deve ser feito com o dinheiro.

Deu em Galileu
Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista