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Mulheres 13/12/2025 11:50

Estudo da UFRN revela que mulheres trabalham cinco anos a mais que os homens ao longo da vida

Estudo da UFRN revela que mulheres trabalham cinco anos a mais que os homens ao longo da vida
O estudo calcula que as mulheres, mesmo com uma jornada remunerada menor, acumulam uma carga total de trabalho significativamente superior à dos homens ao longo da vida.

Com base na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2014, as pesquisadoras Luana Myrrha, professora do Programa de Pós-Graduação em Demografia (PPGDem/UFRN), e a demógrafa Fernanda Felix, egressa do PPGDem/UFRN, mensuraram o tempo dedicado ao trabalho remunerado e aos afazeres domésticos.

Os dados mostram que as mulheres têm uma carga horária remunerada cerca de 15% menor que a dos homens, mas esta é a única frente onde a carga é reduzida. Na esfera doméstica, a situação se inverte de forma dramática e as mulheres dedicam 128% a mais de tempo aos afazeres domésticos que os homens.

Trabalho de casa obriga que mulheres tenham até três jornadas | Foto: Cottonbro – Pexels

A soma das duas jornadas revela que, em uma semana, as mulheres trabalham, em média, 59 horas, enquanto os homens trabalham 51,5 horas.

Essa diferença de 7,5 horas semanais se amplia quando projetada no tempo, de maneira que, em um ano, as mulheres trabalham 358 horas a mais. De acordo com a pesquisa, se considerada uma jornada diária de 12 horas, esse valor representa 30 dias úteis a mais de trabalho por ano.

Em uma métrica de longo prazo, o estudo estima que, em 35 anos, as mulheres acumulam um volume de horas trabalhadas equivalente a 40 anos na trajetória masculina.

Ampliando a lupa

Os pontos cruciais dos achados, no entanto, vão além das médias gerais. A pesquisa detalha como as desigualdades se aprofundam quando se observam características socioeconômicas e demográficas específicas.

A análise compara os perfis de homens com a menor carga total e de mulheres com a maior carga e traz resultados elucidativos. Mulheres com trabalho formal, por exemplo, trabalham 506 horas anuais a mais que homens na informalidade. Mulheres com filhos menores de 14 anos trabalham 501 horas a mais por ano que homens com filhos de idades variadas.

Mulheres com renda de um a dois salários mínimos trabalham 636 horas anuais a mais que homens que ganham até um quarto de salário mínimo.

Média de horas trabalhadas em uma semana, em um ano e em 35 e 30 anos, para homens e mulheres, considerando trabalho remunerado e ações domésticas (Brasil, 2014) | Fonte: Pesquisa

A pesquisa também construiu uma comparação entre dois perfis extremos. De um lado, um homem branco, com alto nível de escolaridade, alta renda, trabalho formal e filhos de idades variadas.

De outro, uma mulher branca, com baixa escolaridade, renda média, trabalho formal e todos os filhos menores de 14 anos. A diferença no tempo total de trabalho foi de 388 horas anuais a favor da mulher, valor superior à média nacional.

O estudo demonstra que, mesmo em um cenário onde o homem tem condições socioeconômicas muito mais favoráveis, dispondo de mais tempo e condições, a mulher ainda carrega uma jornada total maior devido à combinação de trabalho formal e responsabilidades domésticas.

A desigualdade se agrava ainda mais quando se observa a interseção com raça. Para maximizar o contraste de gênero, o estudo comparou, em cada variável, o grupo de homens com menor carga total de trabalho ao grupo de mulheres com maior carga.

No caso da raça, os homens com menor jornada semanal total são os pardos e pretos (51,35 horas), enquanto as mulheres com maior jornada são as brancas (59,12 horas), uma diferença de quase 8 horas por semana, ou 373 horas anuais a mais para elas.

Mulheres brancas estão mais presentes no emprego formal, o que impõe jornadas remuneradas rígidas sem aliviar a responsabilidade quase exclusiva pelos afazeres domésticos.

O cuidado não remunerado com filhos, marido e parentes é parte natural da rotina de muitas mulher | Foto: Diva Plavalaguna – Pexels

Mesmo quando a variável raça é controlada (comparando homens e mulheres dentro do mesmo grupo racial), as mulheres seguem trabalhando significativamente mais.

No cruzamento específico que envolve mulheres brancas inseridas no mercado formal, observa-se que a soma de trabalho pago e não pago é particularmente elevada. Esse resultado evidencia que, no Brasil, a maior inserção feminina no mercado formal não se traduz em alívio, mas frequentemente em dupla penalização.

Cabe destacar que o trabalho formal geralmente exige bater o ponto, o que facilita a contagem mais apurada de horas de trabalho remunerado se comparado a um trabalhador informal.

Além disso, as pessoas brancas são mais frequentes entre aqueles com carteira assinada, ou seja, essa maior facilidade de mensurar o tempo de trabalho pode justificar, em parte, o registro de maior carga de trabalho total para as mulheres brancas.

O peso da aposentadoria

A metodologia do estudo considerou pessoas com dez anos ou mais que estavam trabalhando e realizavam afazeres domésticos na semana de referência, totalizando uma amostra expandida de mais de 64 milhões de indivíduos.

O cálculo partiu da média semanal de horas em cada atividade, transformada em horas anuais multiplicadas por 48 semanas. Esse método permitiu simular diferentes cenários previdenciários.

Um deles é o da aposentadoria integral com 40 anos de contribuição para ambos os sexos, uma possibilidade aberta pelas reformas.

Neste cenário, as mulheres teriam que trabalhar, considerando todo o tempo de trabalho (remunerado + afazeres domésticos) o equivalente a 45,8 anos na medida masculina, ou seja, a igualdade de tempo de contribuição para a aposentadoria integral seria uma realidade muito difícil e penosa para elas.

Professora Luana Myrrha coordena o Laboratório de Estudos de Gênero e População (Laegep), vinculado ao PPGDem/UFRN | Foto: Cícero Oliveira – Agecom/UFRN

A pesquisa lembra que a previdência social brasileira, desde a Constituição de 1988, incorporou uma perspectiva de gênero ao conceder cinco anos de vantagem às mulheres, reconhecendo a dupla jornada advinda da responsabilidade culturalmente imposta às mulheres pelo cuidado dos domicílios e das pessoas.

Este mecanismo é apresentado como um pacto de solidariedade intrageracional, próprio de um sistema de repartição, porém, a igualdade das regras, defendida por alguns como uma modernização, desconsidera esse caráter compensatório, já que a simples dupla jornada já justifica a diferença anterior de cinco anos.

Na prática, essa compensação sempre foi insuficiente para equilibrar outros fatores, como a trajetória laboral mais instável, a inserção precária no mercado e a persistente diferença salarial que as mulheres enfrentam.

Por isso, o estudo alerta sobre as reformas que aproximam as regras para homens e mulheres. De acordo com as pesquisadoras, sem atacar as causas das desigualdades, essas mudanças tendem a agravar a situação econômica na velhice.

Como as mulheres são maioria entre os idosos e já recebem benefícios menores, políticas que dificultam o acesso ou reduzem o valor da aposentadoria podem ampliar a pobreza nessa faixa etária.

Deu em Tribuna do Norte
Ricardo Rosado de Holanda
Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista