Há anos ouvimos que “uma taça de vinho por dia faz bem à saúde”, mas a ciência já provou que não é bem assim - Fatorrrh - Ricardo Rosado de Holanda
FatorRRHFatorRRH — por Ricardo Rosado

Saúde 21/08/2025 15:21

Há anos ouvimos que “uma taça de vinho por dia faz bem à saúde”, mas a ciência já provou que não é bem assim

Há anos ouvimos que “uma taça de vinho por dia faz bem à saúde”, mas a ciência já provou que não é bem assim

Muitas vezes ouvimos dizer que “uma taça de vinho por dia faz bem à saúde”. Outras vezes, que “a quantidade diária recomendada de álcool é zero”. Afinal, quem está certo nesse debate?

As discussões sobre os benefícios e prejuízos de um alimento não se limitam às bebidas fermentadas, como vinho ou cerveja. A relação entre ovos e colesterol é um exemplo clássico, mas também há aparentes contradições em torno do consumo de café, arroz e batata.

A saúde humana tem muitas dimensões e nossa alimentação é bastante variada — mesmo dietas pouco nutritivas envolvem a ingestão de uma ampla gama de compostos, presentes nos próprios ingredientes ou adicionados a eles. Justamente por isso, estudar em detalhes o efeito de cada produto é uma tarefa complexa.

A ciência, portanto, costuma avançar de forma gradual, com uma sucessão de estudos que parecem se contradizer, mas que, na prática, apenas refinam o conhecimento. Com o acúmulo dessas pesquisas, temos hoje uma compreensão cada vez mais clara do que acontece no organismo quando consumimos álcool — mesmo que seja apenas “uma ou duas taças” de vinho.

Para entender melhor o debate, vale começar perguntando: afinal, o que o vinho tem de bom? A ideia de que ele possa trazer benefícios à saúde se baseia principalmente nos polifenóis — substâncias não nutritivas, mas com ação antioxidante.

Esses compostos, presentes nas uvas usadas na fermentação do vinho, podem ser benéficos ao organismo. O detalhe é que eles também estão disponíveis em alternativas não alcoólicas, como o suco de uva integral e a própria fruta.

Em parte por causa desses polifenóis, costuma-se atribuir ao vinho potenciais benefícios para a saúde cardiovascular. Especialistas acreditam que isso possa ocorrer porque eles ajudam a reduzir a pressão arterial e o colesterol. Ainda assim, há divergências entre os estudos sobre esse efeito.

Uma bebida com riscos

O câncer é um dos principais riscos associados ao consumo excessivo de álcool. Diversos tipos da doença estão ligados a esse hábito: além do câncer de fígado, há evidências de relação com câncer de boca, faringe, laringe, esôfago, colorretal e, no caso das mulheres, câncer de mama.

“A resposta para saber se a relação entre consumo de álcool e risco de câncer está claramente estabelecida é sim: há evidência suficiente”, afirmou Marina Pollán, diretora do Centro Nacional de Epidemiologia, em entrevista ao Science Media Centre (SMC) da Espanha. O risco, no entanto, “é proporcional à quantidade ingerida, sendo menor no consumo moderado”.

Além do câncer, o abuso de álcool é amplamente associado à cirrose hepática — que também pode evoluir para um tumor. A doença provoca cicatrizes no fígado e pode ter outras causas, como a hepatite.

Embora o consumo moderado de vinho seja frequentemente relacionado à melhora da saúde cardíaca, o álcool também pode ter o efeito oposto. Estudos ligam seu consumo a miocardiopatia alcoólica, arritmias e outros problemas no coração.

Não se pode esquecer ainda da ligação entre o álcool e questões de saúde mental, como a dependência, além da possibilidade de agravar transtornos já existentes.

Diversas pesquisas feitas nas últimas décadas apontam o álcool como a substância psicoativa mais nociva em termos sociais. Um estudo amplamente citado, realizado no Reino Unido e publicado em 2010 na The Lancet, concluiu que isso não se devia apenas ao impacto individual — nesse quesito, a heroína, o crack e a metanfetamina eram mais danosos —, mas sim ao custo social gerado.

Esses riscos, porém, costumam aparecer em casos de consumo considerado “excessivo”, diferente do “moderado” frequentemente divulgado. O problema é que, deixando de lado convenções sociais e recomendações com pouco embasamento científico, não há clareza se o consumo moderado realmente existe.

Segundo a Monografía Alcohol 2021. Consumo y Consecuencias, do Observatório Espanhol de Drogas e Adições, “não existe nível de consumo de álcool livre de risco”. Por isso, autoridades de saúde preferem falar em consumo “de baixo risco” e não “moderado”. O risco nunca é zero, mas pode ser reduzido.

E o que significa “baixo risco”? De acordo com o relatório Límites de Consumo de Bajo Riesgo de Alcohol, isso corresponde a duas Unidades de Bebida Padrão (UBP) para homens e uma para mulheres. Cada unidade equivale a 10 g de álcool, o que, no caso do vinho, representa cerca de um copo de 100 ml.

Há diferença entre dizer que o consumo moderado de álcool é compatível com uma vida saudável e afirmar que ele traga benefícios à saúde. Também não é o mesmo afirmar que o vinho possa ter um efeito positivo no bem-estar e garantir que esse possível benefício seja maior que os riscos de seu consumo — ou de outras bebidas alcoólicas.

Como vimos no início, as bebidas alcoólicas contêm inúmeros compostos: alguns prejudiciais, outros benéficos. O consenso entre especialistas é que os danos causados pelo álcool superam os possíveis benefícios de substâncias como os polifenóis.

Em resumo, uma taça de vinho por dia dificilmente será fatal, mas é importante conhecer os riscos que ela carrega. Uma alimentação equilibrada e um estilo de vida ativo podem ajudar a reduzir a probabilidade de desenvolver determinadas doenças e, quem sabe, compensar pequenos excessos aos quais nos permitimos de vez em quando.

Deu em Minha Vida

Ricardo Rosado de Holanda
Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista