Humanos 26/07/2025 16:10

Osso de 850 mil anos sugere que ancestral humano canibalizava crianças pequenas

Em comunicado publicado na última quinta-feira (24), o Instituto Catalão de Paleoecologia Humana e Evolução Social (IPHES), responsável pelo achado, sugere que se trata de uma evidência direta de canibalismo infantil.

Pelo local onde a estrutura foi localizada, a prática foi associada ao Homo antecessor, uma antiga espécie hominídea que pode ser considerada um ancestral da nossa espécie.

Momento da descoberta de um dente do Homo antecessor com mais de 850 mil anos em Gran Dolina (Serra de Atapuerca, Burgos) — Foto: Maria D. Guillén/IPHES
Trabalhos de escavação no nível TD6 de Gran Dolina (Serra de Atapuerca, Burgos) — Foto: Maria D. Guillén/IPHES

“O caso é particularmente impressionante, não apenas pela idade da criança, mas também pela precisão dos cortes”, afirma Palmira Saladié, codiretora da escavação em Gran Dolina, emcomunicado.

“Esta vértebra apresenta incisões em pontos anatômicos importantes para a desarticulação da cabeça, indicando que a criança foi processada como qualquer outra presa [preparada em atividades canibais]”.

Canibalismo humano

A vértebra faz parte de um conjunto de dez restos mortais humanos encontrados em julho deste ano no nível TD6 do sítio arqueológico – todos atribuídos ao H. antecessor. Alguns ossos também apresentam marcas de descarnação e fraturas intencionais, indicadores típicos de exploração de carne, semelhantes aos encontrados em ossos de animais consumidos por esses mesmos humanos.

Segundo Saladié, esse hábito não é uma descoberta nova. Há quase trinta anos, naquele mesmo nível arqueológico já tinha sido registrado o primeiro caso conhecido de canibalismo humano no mundo. “O que estamos documentando agora é a continuidade desse comportamento: o tratamento dos mortos não era excepcional, mas sim repetido”, explica a especialista.

A descoberta reforça a hipótese de que esses primeiros humanos exploravam seus pares como fonte de alimento, talvez também como forma de controle territorial. Cerca de 30% dos ossos encontrados na Serra de Atapuerca apresentam marcas de corte e de mordidas humanas. Trata-se de uma evidência consistente de que os corpos encontrados no local foram de fato consumidos.

Como lembra o site Live Science, o H. antecessor só foi identificado nessa região, portanto, sua posição na árvore genealógica é incerta. Desde sua descoberta em 1997, os cientistas debatem se o grupo está próximo dos H. neanderthalensis e dos H. sapiens ou se foi um desdobramento da linhagem.

De qualquer forma, sabe-se que ela é a espécie humana mais antiga encontrada na Europa.

Mais segredos escondidos na caverna

A mesma temporada de campo que trouxe luz à vértebra infantil também levou à identificação de uma latrina de hiena com mais de 1.300 coprólitos, localizada logo acima do nível que contém restos hominídeos. Essa sobreposição ajuda a reconstruir a ocupação alternada da caverna por carnívoros e humanos, oferecendo insights sobre a competição interespecífica em um ambiente hostil.

De acordo com os pesquisadores, há motivos para acreditar que o nível TD6 ainda contém muitos outros restos humanos nas camadas não escavadas.

“A cada ano, descobrimos novas evidências que nos obrigam a repensar como eles viveram, como morreram e como os mortos eram tratados há quase um milhão de anos”, observa Saladié.

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista