Economia 23/05/2025 05:54
Governo anuncia congelamento de R$ 31,3 bilhões no Orçamento de 2025. Dólar retoma alta após fala de Haddad
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva anunciou nesta quinta-feira um congelamento de R$ 31,3 bilhões no Orçamento de 2025 para cumprir as regras fiscais, ao divulgar o Relatório Bimestral de Receitas e Despesas, documento que faz uma atualização das projeções orçamentárias.
A equipe econômica liderada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, também anunciou um aumento de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para reforçar a arrecadação.
Decreto publicado hoje com vigência a partir de meia-noite eleva a cobrança de IOF em atividades de câmbio, crédito e seguros. No caso do crédito, há condições diferentes para empresas, microempreendedores individuais e pessoas físicas. Sem o decreto, cujos efeitos já foram incorporados às estimativas, o governo precisaria fazer uma contenção ainda maior para fechar as contas.
A maioria das mudanças começa a valer de imediato e deve permitir R$ 20,5 bilhões em arrecadação neste ano e R$ 41 bilhões em 2026, totalizando R$ 61,5 bilhões em dois anos.
Logo após circularem as primeiras informações sobre o congelamento de recursos, o dólar comercial passou a operar em forte queda. Pouco depois das 14h30, a moeda americana estava cotada a R$ 5,59, em queda de 0,70%. A Bolsa firmou alta e alcançou 0,5% de valorização no início da tarde. Mas o cenário mudou rapidamente.
À medida que transcorreu a entrevista coletiva dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet, no meio da tarde, houve uma inversão dos indicadores. Os juros futuros, que subiam, inverteram o sinal e passaram a cair.
Com a apresentação de piora da projeção para o resultado das contas públicas, o dólar inverteu o sentido e fechou em alta de 0,32%, cotado em R$ 5,66. O Ibovespa também inverteu o sinal e fechou com recuo de 0,44%, aos 137.273 pontos, poucos dias depois de ter superado pela primeira vez os 140 mil pontos.
No mercado futuro, o dólar subiu 1,87%, a R$ 5,7635, e o Ibovespa futuro recuou 1,93%, informou o Valor, indicando que a abertura do mercado nesta sexta-feira deve ser tensa.
Os ânimos mudaram após a divulgação de uma perspectiva de piora fiscal para 2025. Agora, a projeção saiu de superávit de R$ 14,6 bilhões na aprovação do Orçamento para déficit R$ 31 bilhões, no limite inferior da meta.
Na entrevista coletiva encerrada pouco depois de 16h, o ministro Haddad afirmou que o governo só detalharia as medidas sobre aumento de IOF após as 17h, quando fecham os mercados financeiros. Ele criticou vazamentos e especulações no mercado e negou boatos sobre aumento de IOF sobre dividendos e transações financeiras.
O ministro mostrou irritação com as especulações no mercado e alegou obrigações protocolares que a pasta tem de cumprir em relação à divulgação de medidas econômicas sensíveis ao mercado.
Ao longo da coletiva de Haddad e Tebet, com a apresentação, o dólar inverteu o sentido e passou a operar em alta. Às 16h, a moeda americana voltava a operar em alta de 0,2%, aos R$ 5,65. O Ibovespa também inverteu o sinal, caindo 0,33%, aos 137.421 pontos.
— O governo segue superestimando receitas e subestimando despesas — afirma o estrategista-chefe Gustavo Cruz, da RB Investimentos, sobre a queda do Ibovespa.
Para Gustavo Okuyama, gestor da Porto Asset, a previsão fiscal trazendo um valor próximo ao piso inferior da meta, e não no centro, e a falta de informações de como será a implementação do aumento do IOF pesaram nos ativos.
A meta fiscal deste ano é de resultado zero (equilíbrio entre despesas e receitas), com intervalo de tolerância entre déficit de R$ 31 bilhões e superávit de R$ 31 bilhões, ou 0,25% do Produto Interno Bruto (PIB). O Orçamento foi aprovado pelo Congresso com uma previsão de resultado superavitário de R$ 15 bilhões.
Veja as medidas do governo:
Apesar das cifras, o governo ainda não sabe que pastas e programas serão afetados pelo congelamento orçamentário. O detalhamento da contenção, por órgão, constará de decreto a ser publicado no próximo dia 30. Os órgãos deverão indicar as programações a ser bloqueadas/contingenciadas em até cinco dias úteis.
O congelamento de despesas recai sobre os gastos não obrigatórios, que incluem despesas de custeio da máquina (como contratos terceirizados) e investimentos públicos (como obras e aquisição de máquinas e equipamentos). No fim de março, Lula editou um decreto para segurar as despesas de forma preventiva, o que já vinha fazendo os ministérios gastarem mais lentamente.
— O que está no nosso radar é a questão da Previdência, que ainda é um desafio no Brasil, e a questão do BPC (Benefício de Prestação Continuada). É um programa que está muito judicializado — disse o ministro da Fazenda, Fernando Haddad.
O ministro disse que o monitoramento da Fazenda e do Planejamento e o fiscal são temas diários e que as equipes estão o tempo todo trabalhando nas planilhas para tentar prever o que está acontecendo, para evitar surpresas desagradáveis neste ano ou no próximo.
— Muita gente do mercado previa uma necessidade menor do que essa, mas nós fizemos questão de ser muito transparentes em relação à execução, para que houvesse também por parte do Congresso, do Judiciário, aquela harmonia que nós precisamos para tocar essa agenda à frente. Estamos em um ano não eleitoral e temos de aproveitar este ano para levar ao Congresso nossas preocupações — disse ele. — A caixa-preta do Orçamento está 100% aberta. Todo mundo vai poder fazer conta de quem está levando parte do Orçamento, se é justo ou não.
Haddad disse que, na reunião com o presidente Lula para discutir o tema, todos os ministros concordaram com as medidas.
— Não é surpresa para ninguém. Todo mundo entendeu. Vamos fazer o necessário, como fizemos no ano passado. Vamos continuar nessa batalha, porque entendemos que é o melhor que o Brasil pode ter.
Para ele, há uma preocupação natural sobre o cumprimento da meta porque no passado ninguém cumpriu o resultado previsto.
O governo decidiu bloquear os gastos após os benefícios previdenciários subirem R$ 15,6 bilhões acima do previsto; de o Plano Safra crescer R$ 4,5 bilhões; e de o Benefício de Prestação Continuada (BPC) se elevar em R$ 2,8 bilhões. O bloqueio de R$ 10,6 bilhões aconteceu mesmo após o governo abrir um espaço de R$ 12,4 bilhões no teto, permitido em lei devido à diferença da inflação projetada na confecção do Orçamento e o resultado inflacionário final.
— O bloqueio foi feito após a abertura do crédito de R$ 12,4 bi. Daí vemos que as despesas obrigatórias cresceram cerca de R$ 23 bilhões — destacou o secretário do Orçamento, Clayton Montes.
Já o contingenciamento ocorreu por conta de uma frustração de receitas da ordem de R$ 31,3 bilhões, compreendendo concessões, royalties e outros impostos.
— Há um dever de casa que o Ministério do Planejamento está fazendo com apoio de todos os ministérios e do presidente Lula de contenção de gastos. Visando à eficiência dos gastos públicos — disse a ministra do Planejamento, Simone Tebet.
Em relação às receitas, o governo fez um ajuste significativo na arrecadação extraordinária, que era inicialmente de R$ 168 bilhões. Só de receitas administradas pela Receita houve uma redução de R$ 81,5 bilhões. Considerando a retirada da previsão de outorgas de ferrovias, o recuo na previsão de receitas extraordinárias chega a R$ 90 bilhões. Ou seja, sobram cerca de R$ 78 bilhões em relação à previsão aprovada no Orçamento.
Nas receitas administradas pela Receita, a maior queda foi referente à arrecadação nos desempates dos julgamentos do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). Inicialmente, a previsão era de R$ 28,5 bilhões, agora o governo não vai contar com mais nenhum recurso.
Isso ocorre após a enorme frustração no ano passado. Em 2024, o governo previu R$ 56 bilhões com o Carf, mas arrecadou menos de R$ 1 bilhão. A previsão de receitas com as transações tributárias também caiu significativamente, de R$ 31 bilhões para R$ 5 bilhões.
Da mesma forma, foi atualizada para zero a projeção de R$ 20 bilhões com a revisão de benefícios tributários. Nesse caso, o secretário da Receita Federal, Robinson Barreirinhas, destacou que esse valor foi distribuído no aumento de arrecadação nos setores mais controlados.
— Em linha de extremo conservadorismo, a gente não colocou a tributação das empresas beneficiadas pelo Perse — completou Barreirinhas, lembrando que os R$ 15 bilhões reservados para o programa já foram alcançados.
O governo ainda deixou de contar com R$ 7,5 bilhões com o aumento da CSLL, medida que foi enviada ao Congresso, mas não foi aprovada.
O secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, reforçou que as estimativas são conservadoras e que, agora, tudo que entrar vai ajudar nas projeções fiscais:
— Agora o risco é de ter surpresas positivas.
Para compensar, o governo deve propor um aumento do IOF, medida que não foi detalhada ainda.
O governo ainda vai enviar um projeto de lei ao Congresso para permitir a venda da parte do óleo relativa à União do pré-sal. Segundo o secretário executivo Dario Durigan, a arrecadação pode chegar a R$ 15 bilhões, mas depende do valor do barril do petróleo no mercado internacional. Essa estimativa, porém, ainda não está considerada na atualização do Orçamento realizada nesta quinta.
— É um projeto de iniciativa do Ministério de Minas e Energia, com apoio da Fazenda e da Casa Civil. É uma autorização para que o óleo de áreas adjacentes possa ser vendida, a parte da União. Depende muito a estimativa de arrecadação porque depende do valor do barril do petróleo. Mas acho que uma estimativa conservadora é R$ 15 bilhões. Mas ainda tem de passar pelo Congresso — disse Durigan.
O congelamento de recursos já na primeira atualização do Orçamento deste ano mostra uma postura diferente do governo em relação ao ano passado, quando a contenção só ocorreu no terceiro relatório bimestral, mesmo com diversos alertas sobre os riscos às metas fiscais.
Há ainda expectativa por um anúncio de medidas adicionais de contenção de despesas e aumento de receitas nesta quinta. A coletiva de imprensa do relatório bimestral contará, pela primeira vez, com a presença dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad, e do Planejamento, Simone Tebet.
Na semana passada, Haddad afirmou que apresentaria ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva medidas pontuais para cumprir a meta fiscal deste ano.
— Não dá para falar de pacote. São medidas pontuais, nenhuma de escala, para o cumprimento da meta fiscal — afirmou. — Não existe pacote, existe um conjunto de medidas que são corriqueiras da administração séria que está sendo feita de cumprir o que foi estabelecido com a sociedade — disse.
Segundo especialistas, o Orçamento aprovado tinha despesas subestimadas e receitas superestimadas. No caso dos gastos, as preocupações são as mesmas: os benefícios previdenciários e os assistenciais, como o Benefício de Prestação Continuada (BPC).
Do lado da arrecadação, o governo contou, na época da aprovação da peça orçamentária, com cerca de R$ 168 bilhões em receitas extraordinárias para fechar as contas deste ano. Dentre elas, estava prevista, por exemplo, a entrada nos cofres públicos de R$ 28,5 bilhões referentes ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf). No ano passado, inicialmente, a previsão inicial era de arrecadação de R$ 56 bilhões com os desempates na Corte tributária, mas o resultado final foi de menos
Em São Paulo, pouco antes da coletiva de Haddad e Tebet, o ministro dos Transportes, Renan Filho, afirmou que o governo federal anunciaria um contingenciamento de R$ 31 bilhões, além de um aumento no Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).
— O governo vai anunciar o mais robusto decreto de contingenciamento do governo Lula, no valor de R$ 31 bilhões, e vai anunciar um incremento de IOF — disse Filho por volta das 15h04, poucos minutos antes do anúncio oficial do governo.
No entanto ele disse ter comentado notícias que a imprensa já estava adiantando naquela altura.
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