Se você é como a maioria das pessoas, provavelmente gasta mais tempo do que gostaria clicando e navegando na internet.
O hábito pouco saudável pode impedir você de prestar atenção ao que é realmente importante ou até cumprir tarefas da rotina.
Então por que é tão difícil resistir?
A explicação mais comum é que as grandes empresas de tecnologia estão competindo pela sua atenção e, por isso, desenvolveram sistemas e algoritmos sedutores que deixam você distraído.
Um artigo publicado em agosto na revista Neuroscience of Consciousness, porém, sugere que a resposta talvez esteja em outro lugar.
Na publicação, o filósofo Jelle Bruineberg, da Universidade de Copenhagen, na Dinamarca, propõe que é o combo do desejo da nossa própria mente pela novidade, combinado com a capacidade das tecnologias digitais de fornecer exatamente isso — em qualquer lugar, o tempo todo —, que tornam nossos celulares tão irresistíveis.
“Quando sentimos esse desejo de verificar nosso e-mail ou as últimas notificações do Facebook, não é porque estamos sendo bombardeados por informações. Muitas vezes, nem sequer estamos interagindo com nosso telefone celular quando surge a necessidade”, avalia Bruineberg, em comunicado.
“Mas a ação de verificar nosso telefone nos proporciona acesso fácil a uma recompensa muito satisfatória: uma informação nova. Esse desejo é, de acordo com a neurociência cognitiva, um aspecto básico da forma como as nossas mentes funcionam.”
Engana-se, contudo, quem pensa que esse desejo por informação nova poderia ser substituído por formas mais analógicas — digamos, uma biblioteca, que também contém uma grande quantidade de informações.
“Não faria sentido desenvolver o hábito de verificar um livro específico. Seria muito complicado, e além disso a informação num livro é estática, não muda repentinamente da mesma forma que a informação no mundo digital muda”, pontua Bruineberg.
“As tecnologias digitais nos fornecem os meios para alcançar essa recompensa quase sem nenhum esforço.”
Essa combinação de acesso sem esforço e conteúdo novo a todo minuto é o que nos torna tão propensos a desenvolver o que o filósofo chama de “hábitos de verificação.”
Incompatibilidade entre mente e tecnologia
Ainda segundo o autor, o debate atual sobre a economia da atenção se apoia em uma forma específica de analisar a interação entre atenção e informação: a suposição de que, antes do advento da tecnologia digital, quando a informação era escassa, éramos capazes de controlar a nossa atenção como queríamos.
Seguindo essa lógica, se estivéssemos expostos a menos informação, o problema estaria resolvido. “Mas nada sugere que controlar a atenção é algo que sempre foi fácil”, destaca Bruineberg.
Basta notar que, ao longo da história, muitas comunidades religiosas enfatizaram práticas meditativas e contemplativas que foram concebidas para ajudar os praticantes a alcançar algum controle sobre a atenção e a se livrar das distrações do dia a dia.
Por isso, avalia o autor, em vez de introduzir distrações, é mais provável que as redes sociais tenham criado formas diferentes e talvez mais difundidas de se distrair.
“A ideia que apresento é que existe um profundo descompasso entre a forma como as nossas mentes funcionam e a estrutura das modernas tecnologias digitais. Mas não se trata de sermos inundados por um monte de informações”, destaca.
No fim das contas, o que acontece é que nós — e nossa mente — não seríamos capazes de lidar com ambientes que permitem engajamento irrestrito e sem atrito com fontes infinitas de novidades e recompensas.
A única forma de barrar isso, na opinião do autor, é restringir fortemente nosso acesso ao ambiente digital.
“Por exemplo, receber e-mails apenas duas vezes por dia garante que não haja nenhuma novidade em sua caixa de entrada entre esses momentos. Daqui a 50 anos, provavelmente olharemos para trás com horror e veremos quão complexos e irrestritos são os nossos atuais ambientes digitais”, conclui.