Curiosidades 25/06/2023 09:34

Beija-flores bebem álcool com mais frequência do que pensamos, diz estudo

De acordo com a pesquisa, os pássaros consomem cerca de 80% da massa corporal em alimentos alcoólicos, as descobertas podem auxiliar a entender o alcoolismo humano

Você já deve ter ouvido que o álcool é a água que o passarinho não bebe.

Contudo, um novo estudo publicado no periódico Royal Society Open Science aponta que, na verdade, essa expressão popular não se aplica aos beija-flores.

Muitas vezes, bebedouros para beija-flores são enchidos com água açucarada.Mas nós nos esquecemos de que essa mistura resulta num experimento natural de fermentação, com o calor ajudando a transformar parte do açúcar em álcool.

Além disso, esse composto químico pode ser obtido de outras maneiras na natureza, como em flores cheias de néctar – que são um ponto de encontro ideal para leveduras, um tipo de fungo, e para bactérias que metabolizam o açúcar e produzem etanol.

Com isso em mente, um novo estudo da Universidade da Califórnia em Berkeley (EUA) investigou se beija-flores preferem ou rejeitam água açucarada levemente alcoólica – e descobriram que essas aves tomam líquidos de bebedores que contenham até 1% de álcool por volume.

A pesquisa faz parte de um projeto de longo prazo de Robert Dudley, professor de biologia integrativa na universidade americana, e seus colegas da instituição de ensino – o herpetólogo Jim McGuire e o especialista em pássaros Rauri Bowie, que também são professores de biologia integrativa e atuam como curadores do Museu de Zoologia de Vertebrados da Universidade da Califórnia em Berkeley.

Os pesquisadores convidaram alunos de graduação para analisar o comportamento dos beija-flores que visitavam o bebedouro ao lado da janela do escritório de Dudley – já que o estudo foi feito durante o período mais agudo da pandemia de Covid-19, era inviável para a equipe realizar testes nas florestas da América Central e da África, onde há pássaros que se alimentam de néctar.

Assim, as análises envolveram três beija-flores machos da espécie Calypte anna que residem o ano todo na região da Universidade da Califórnia em Berkeley.

“Os beija-flores consomem 80% de sua massa corporal por dia em néctar“, comenta Dudley em nota.

“A maior parte é água e o restante é açúcar. Mas, mesmo que haja concentrações muito baixas de etanol, esse consumo volumétrico renderia uma dosagem alta de etanol, se ele estivesse lá fora. Talvez, com os dosadores, não estejamos apenas cultivando beija-flores, mas sim lhes providenciando um ‘assento no bar’ toda vez que eles se aproximam.”

Enquanto os beija-flores do estudo não demonstraram se incomodar com até 1% de álcool por volume de água, eles mudavam seu comportamento quando o nível de etanol subia para 2% no bebedouro.

Neste caso, os animais tomavam apenas metade do que costumavam tomar do líquido açucarado (com ou sem álcool). “Eles estavam consumindo a mesma quantidade total de etanol; apenas reduziram o volume da solução ingerida a 2%. Isso foi realmente interessante”, destaca Dudley.

“Isso foi uma espécie de efeito de limiar e nos sugeriu que, o que quer que aconteça [com os beija-flores] no mundo real, provavelmente não excede 1,5%.”

Já ao testarem o nível de álcool na água com açúcar que ficou no bebedouro por duas semanas, os autores do estudo encontraram uma concentração muito menor: cerca de 0,05% por volume.

“Agora, 0,05% simplesmente não parece muito – e não é mesmo. Mas, novamente, se você bebe 80% do seu peso corporal por dia, com 0,05% de etanol, você obtém uma carga substancial de etanol em relação à sua massa corporal“, observa Dudley. “Portanto, tudo é consistente com a ideia de que há uma exposição natural e crônica a níveis fisiologicamente significativos de etanol derivado dessa fonte nutricional.”

O especialista acrescenta:

“Os beija-flores queimam o álcool e o metabolizam muito rapidamente. Assim como fazem com os açúcares. Portanto, provavelmente não veem nenhum efeito real do álcool. Eles não estão ficando bêbados”.

Com essas informações, os pesquisadores querem entender o papel que o álcool desempenha nas dietas dos animais – particularmente nos trópicos, onde as frutas e o néctar açucarado fermentam facilmente, levando diferentes espécies a ingerirem álcool frequentemente.

Nenhum outro estudo sistemático do teor alcoólico de frutas e néctares, ou do consumo de álcool por pássaros, insetos ou mamíferos sugadores de néctar, ou por animais comedores de frutas, incluindo primatas, foi feito.

E, até o momento, o artigo não conseguiu estabelecer se o álcool é um fator que chama atenção dos beija-flores a um bebedouro ou não.

É o caso de um artigo de 2008 que descobriu que o néctar das flores de palmeira consumido por musaranhos –pequenos seres vivos semelhantes a ratos que vivem no oeste da Malásia – tinha níveis de álcool de até 3,8% por volume.

Já outro estudo, publicado em 2015, encontrou uma concentração relativamente alta de álcool – até 3,8%, – no néctar ingerido pelos slow lóris e pelos aie-aie, dois tipos de primatas.

A pesquisa concluiu que esses animais preferiam néctar com maior porcentagem alcoólica.

Para a equipe da Universidade da Califórnia em Berkeley, o próximo passo é medir quanto de etanol é encontrado naturalmente nas flores, e também determinar com que frequência esse composto é consumido por outros tipos de pássaros.

Dudley ainda acredita que, no futuro, sua pesquisa possa ajudar a entender o porquê de os humanos se sentirem atraídos pelo álcool.

Deu em Galileu

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista