Para o cientista, não é possível afirmar que a ômicron seja a variante da transição para uma situação de calmaria por algumas razões.
Primeiro, a nossa vigilância de casos já é ínfima, e, desses positivos, o número daqueles em que tentamos determinar qual variante está presente é ainda menor.
Assim, “a gente não sabe o que está por aí, não temos uma vigilância molecular para dizer, ‘ok, é só ômicron’. Pode haver um monte de outras variantes circulando que a gente simplesmente não esteja vendo”, sugere.
Conhecendo toda a história da variação molecular nos outros coronavírus, é absolutamente possível que haja outras variantes, talvez só esperando o momento que a ômicron leve a uma imunidade tão grande a ela mesma que entre em extinção e elas assumam.
O pesquisador lembra que a evolução não para.
“Os vírus com outras mutações podem já estar aí, só esperando um momento mais favorável. Isso é um conceito importante. Você sempre tem vírus pré-selecionados em uma população de coronavírus, que podem ganhar a chance de escalar o pico do sucesso.”
Isso quer dizer que, a cada momento, a evolução conta com vírus já prontos para selecionar, fora os novos mutantes que vão surgindo durante a replicação. Mas sempre há esta espécie de “pré-seleção” ali já aguardando para ser selecionada.
“Claro que, quanto mais pessoas infectadas, mais vírus temos se replicando. E quanto mais vírus se replicando, mais chance de surgir uma variação útil para o vírus. É matemática”, alerta, já explicando por que ele considera um erro alguns governos na Europa estarem abrindo mão de praticamente todas as medidas mitigadoras de contágio.
“Em primeiro lugar, mesmo na Europa, onde temos uma vigilância mais intensa, não é possível saber todas as variantes que circulam ali. Outro erro é que sempre há uma amplificação do sinal do que uma autoridade diz quando a mensagem chega à população. Se a autoridade fala, ‘podemos relaxar um pouco as medidas’, o sinal vai ser lido como ‘acabou, não precisamos mais controlar nada’.”
A letalidade mais baixa, de acordo com Brandão, também não pode ser considerada uma justificativa. Uma porcentagem pequena de um número extremamente alto de infectados ainda é um número grande de pessoas morrendo. Por fim, ele aponta o erro de não considerar a forma crônica da doença.
“A forma crônica pode vir a se apresentar de modo terrível, com grandes incapacitações.”
A ômicron foi reportada há um pouco mais de dois meses, então só conhecemos sua forma aguda. “Não sabemos como ela se comporta em um paciente três ou quatro meses depois da alta, e que pode ter problemas neurológicos, renais, hepáticos, de coagulação”, adverte.