Crônica 15/09/2021 08:02

Uma noite épica há 60 anos – Por Alex Medeiros

Por quase 60 anos, Assis Queiróz guardou as páginas daquela madrugada espetacular e em julho passado encadernou tudo, fazendo chegar ao meu conhecimento através da cópia que presenteou seu cunhado Carlos Rosado.

O advogado Assis Queiroz, Cizinho para os muitos amigos que acumulou em todo o RN, principalmente em Natal e Mossoró, está prestes a comemorar 60 anos da formatura em Direito pela Faculdade Cândido Mendes, do Rio de Janeiro, em novembro de 1962.
Na noite da festa de formatura, ele e mais duas dezenas de colegas entraram pela madrugada nas mesas do Bar Luiz, um dos mais antigos da cena carioca, fundado em 1887. Foi uma noite épica.
O Bar Luiz, patrimônio cultural do Rio e point de gerações de intelectuais e artistas, era chamado até 1942 de Bar Adolfo, até ser ameaçado de depredação por falsa suspeita de que seu nome era uma alusão a Hitler.
Na noite de 28 de novembro de 1962, Assis e seus amigos ficariam marcados por um episódio mais que especial, quando o último cliente, isolado numa mesa de fundo, se empolgou com a jovial animação dos rapazes e juntou-se ao grupo.
Era um sessentão, que ao tomar ciência da confraria de formandos pediu licença, papel e lápis para escrever uma homenagem aos futuros advogados. O senhor compôs uma poesia com 48 linhas e pôs como título “Ipso Facto”.
Ao finalizar o texto, disse que todos ali iriam assinar embaixo, para ficar registrado a noite tão especial. Ao colocar seu nome e passar a folha aos rapazes, todos se entreolharam surpresos diante de um famoso compositor.
Frequentador assíduo do Bar Luiz desde as décadas que o estabelecimento passou por vários nomes, aquele senhor, um dos grandes poetas do mundo do samba, gastou alguns minutos para marcar para sempre os jovens formandos.
Por quase 60 anos, Assis Queiróz guardou as páginas daquela madrugada espetacular e em julho passado encadernou tudo, fazendo chegar ao meu conhecimento através da cópia que presenteou seu cunhado Carlos Rosado.
Abaixo, a poesia escrita em 28 de novembro de 1962:
IPSO FACTO
(Lamartine Babo)
Tomado assim de surprêsa
Como queiram, de improviso…
Vejo crescer minha mêsa,
neste momento preciso!…
Éramos dois, entretanto,
foram chegando outros tantos,
aumentando o nosso encanto,
entre poesias e… CANTOS!…
Rapazes, recem-formados,
em Direito! Cada qual
dirigindo os próprios MANDOS…
Neste mês, fins de novembro
em datas… (Como eu me lembro)
formação de doutorandos
no aproximar do Natal!…
Vocês, meus nobres rapazes,
aos quais, julgo tão capazes,
Juro por Deus; já nem sei…
A vocês, donos da Lei…
pelo Brasil, responsáveis,
até nos Laços imutáveis,
A vocês, peço desculpas
Se maiores minhas culpas,
por versos bons não fazêr!..
Mas, vamos todos beber…
“Bebemorar” neste bar… 
que é o fim de uma tradição,
Como é gostoso lembrar
Bar Adolfo o ALEMÃO –
Conflitos! Sempre aparecerá…
Em vocês, a alma transborda…
Vou gastar o meu latim:
– Silêncio pois. “Sursum Corda”…
Da oração, chego ao fim
Nestes meus dias cansados!…
na idade da “meno  pausa”…
Sejam meus advogados
Sem ser médicos na causa!
E… nesta oportunidade
entre chopps alegria
Na minha maturidade.
Seja de noite ou de dia
quero saudá-los, ao lado
de um poeta consumado,
nesta noite de lembrança!
Faço um pedido porém,
– Um Habeas-Corpus de Esperança
para nós tôdos! Amém!

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista