10/12/2018 11:25

A nova discussão jurídica é o “tabelamento da honra”

É dos juízes a responsabilidade de decidir o valor de indenizações em casos de danos extrapatrimoniais (ou danos morais), mas tal premissa é alvo de debates no Direito, no Brasil e fora dele, há décadas.

É dos juízes a responsabilidade de decidir o valor de indenizações em casos de danos extrapatrimoniais (ou danos morais), mas tal premissa é alvo de debates no Direito, no Brasil e fora dele, há décadas.

Por aqui, foram várias as tentativas de tabelar ou padronizar os valores pagos para casos semelhantes, todas sem êxito.

Ao ser aprovada em junho de 2017, a Lei 13.467, que instituiu a reforma trabalhista, tenta novamente pré-estabelecer critérios para esse tipo de compensação.

O artigo 223-G da nova norma, que alterou a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), estabelece o que pode ser considerado dano moral, a gravidade desses delitos e quanto se deve pagar de indenização por eles.

O artigo classifica como leve, média, grave e gravíssimas as infrações, e os critérios de valoração se baseiam nos salários recebidos pelos reclamantes.

O dispositivo, na visão de especialistas na área do Direito do Trabalho ouvidos pelo JOTA, porém, limita o poder de jurisdição e abre brechas para decisões discriminatórias, ferindo a Constituição Federal.

Entre os principais argumentos trazidos na defesa da inconstitucionalidade está a dissonância da regra com o artigo 5º inciso 5 da Constituição, que diz que “é assegurado o direito de resposta, proporcional ao agravo, além da indenização por dano material, moral ou à imagem”, ou seja, a compensação deve ser definida de acordo com o dano cometido.

A novidade trazida pela reforma, inclusive, é alvo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5870 no Supremo Tribunal Federal (STF), ajuizada pela Associação Nacional dos Magistrados do Trabalho (Anamatra).

A entidade justifica que, ao determinar que as indenizações por danos morais sejam calculadas de acordo com o salário dos trabalhadores, o princípio de isonomia é violado, e cita como precedente a decisão sobre a Lei de imprensa.

Em 2009, o STF julgou inconstitucional a Lei de Imprensa (5.250/1967), que em um de seus artigos categorizava e pré-determinava os valores de indenização para cada tipo de ofensa moral. Um dos argumentos utilizados pela Corte para a invalidade foi justamente o conflito com o artigo 5º.

O professor de Direito do Trabalho na pós-graduação da Faculdade de Direito de Ribeirão Preto da USP, Jair Aparecido Cardoso, ainda ressalta a diferença de regulamentação do dano moral nas esferas civil e trabalhista com a nova lei.

“De repente, você vai almoçar em um shopping depois do trabalho junto com uma funcionária do shopping. O telhado cai e machuca as duas. Uma será balizada pela lei civil e a outra vai ter como base a lei trabalhista, e os danos morais dela serão tabelados. Isso causa desconforto e é totalmente antissocial”, exemplifica.

Para o advogado Paulo Lemgruber, do Mauro Menezes Advogados, a Lei fere o princípio de isonomia e da dignidade humana, mas vai além. “Ao limitar a decisão do juiz, está violando o princípio da separação de poderes.

Ela ofende também o princípio do meio ambiente de trabalho adequado – se há uma indenização tarifada, você está incentivando o trabalhador a manter um trabalho inadequado”, acredita.

Lembruger ainda comenta que a aplicação do dispositivo 223-G está bastante difusa, e que não é possível perceber uma corrente de pensamento predominante entre os juízes.

O professor Cardoso ainda ressalta que a Lei 13.467 deixou um vácuo no que se refere aos danos estéticos, que não estão especificados nos danos extrapatrimoniais. “O dano estético é típico de acidente de trabalho, mas ele não consta no artigo.

Então, na minha visão, não fica claro se esse dispositivo deve ser aplicado somente para os danos morais específicos da relação de emprego ou se também se aplica para acidentes de trabalho”, opina.

Enquanto o STF não julga o ADI 5870, os processos que pedem indenização por danos morais estão chegando às varas de 1ª instância e, em menor volume, aos Tribunais Regionais do Trabalho.

Por enquanto, justamente por conta da pouca quantidade de casos nos TRTs, ainda não há pacificação de jurisprudência e os juízes têm interpretado o dispositivo da Lei de maneiras diferentes.

Deu em JOTA

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista