Celebridades 28/06/2025 11:55
Raul Seixas, 80 anos: oito curiosidades que você provavelmente não sabe sobre o cantor
Neste sábado (28/6), o cantor e compositor Raul Seixas (1945-1989) completaria 80 anos.
Autor de Ouro de Tolo, Metamorfose Ambulante e Mosca na Sopa, o baiano de Salvador, vítima do alcoolismo aos 44 anos, viveu pouco e intensamente.
Abaixo, oito curiosidades que provavelmente você não sabia sobre um dos maiores nomes do rock brasileiro — incluindo as alfinetadas que trocou com Belchior, um suposto encontro com John Lennon, as composições de música brega, o sonho da Cidade das Estrelas e um velório tumultuado.
Raul vivia tendo crises de paranoia, surtos que passaram a ser frequentes no fim dos anos 1970, fase em que o cantor mergulhou fundo no uso de cocaína.
Em visita ao apartamento do roqueiro, no bairro carioca de Copacabana, Caetano Veloso foi recebido por um Raul armado com dois revólveres calibre 38 na cintura, ao melhor estilo Cowboy Fora da Lei, pronto para um duelo imaginário.
Veloso já contou essa história em algumas ocasiões, inclusive em seu livro Verdade Tropical.
Neste mesmo apartamento de Raul moravam dois argentinos: Oscar Rasmussen e Hugo Amorrortu.
O primeiro virou parceiro de Raul no disco Por quem os sinos dobram, considerado o pior álbum da discografia do roqueiro — havia uma suspeita, jamais confirmada, de que Rasmussen fornecia cocaína em troca de parceria nas composições, o que poderia explicar a baixa qualidade do disco.
O segundo argentino, Hugo Amorrortu, faixa preta de caratê, virou segurança de Raul.
Em dezembro de 1979, de acordo com uma matéria do jornal O Globo, o próprio Amorrortu acabaria assassinado dentro do apartamento de Raul ao perceber que traficantes estariam lhe vendendo açúcar em vez de cocaína. Ao reagir, o argentino trocou tiros com os traficantes e acabou morto.
Crédito,Getty Images O edifício Dakota, em Nova York, onde Raul Seixas e Paulo Coelho teriam sido hospedados por John Lennon
Em 1989, em entrevista ao programa Jô Soares Onze e Meia, do SBT, Raul falou sobre os quatro dias em que ele e Paulo Coelho, amigo e escritor, tornaram-se hóspedes de ninguém menos do que o cantor e ex-Beatle John Lennon. Tudo mentira.
“Conversamos sobre as pessoas que fizeram a cabeça do planeta Terra, e aí ele me perguntou qual a grande figura do Brasil. Eu não tinha ninguém para citar, falei Café Filho [presidente do Brasil entre 1954 e 1955]. Ele perguntou: ‘Quem?’ Aí eu disse: ‘Nada…'”
Segundo Raul, ele e John teriam trocado cartas por muito tempo — o que explicaria o convite para hospedá-lo em Nova York.
“A gente já se comunicava sobre a Sociedade Alternativa [filosofia propagada por Raul]. Ficamos amigos”, disse o cantor em entrevista ao jornalista Pedro Bial em 1983.
Ele e Paulo Coelho estiveram sim no edifício Dakota, em Nova York, mas só conseguiram trocar meia dúzia de palavras com Yoko Ono, esposa de Lennon que os recebeu na portaria e os despachou sem cerimônia.
Isso foi em 1974.
Seis anos depois, exatamente no mesmo lugar, John Lennon foi assassinado por Mark Chapman, que estava longe de ser um maluco beleza.
Mas é que se agora para fazer sucesso/ Para vender disco de protesto/ Todo mundo tem que reclamar/ Eu vou tirar meu pé da estrada/ E vou entrar também nessa jogada/ E vamos ver agora quem é que vai aguentar.
Numa de suas melhores e mais sarcásticas canções, Eu também vou reclamar, gravada no disco Há dez mil anos atrás, de 1976, Raul ironizava os compositores que insistiam em choramingar, falando dos mesmos temas de sempre.
Era uma indireta a Belchior, o compositor cearense que cantava as agruras do nordeste, seguindo, para Raul, a velha receita de fazer música de protesto para vender discos.
Raul não cita Belchior nominalmente na letra de Eu também vou reclamar, mas é fácil identificar as provocações.
Crédito,Getty Images Cantor e compositor Belchior trocou farpas com Raul, muitas em letras de músicas
O verso Não há galinha em meu quintal é uma alusão à canção de Belchior Galos, Noites e Quintais.
O trecho Agora sou apenas um latino-americano/ Que não tem cheiro nem sabor faz referência a um dos clássicos do compositor cearense, Apenas um rapaz latino-americano.
Belchior respondeu na mesma moeda. Em Alucinação, o recado é para Raul e seus romances astrais citados em Trem da Sete:
Eu não estou interessado em nenhuma teoria/ Nem nessas coisas do oriente, romances astrais/ A minha alucinação é suportar o dia a dia/ E meu delírio é a experiência com coisas reais
Crédito,Acervo da família/Foto de Frederico Mendes Raul em Copacabana, onde morou; na fase carioca, ele compôs para intérpretes românticos
Em Ouro de tolo, Raul canta: Eu devia estar alegre e satisfeito/ Por morar em Ipanema/ Depois de ter passado fome por dois anos/ Aqui na Cidade Maravilhosa.
Na sua temporada carioca, vivida no fim dos anos 1960, Raul não comeu o pão que o diabo amassou porque não havia nem pão.
O rock, depois do estouro da Jovem Guarda, havia perdido espaço para as canções de protesto, sintonizadas com o momento do país.
Raul, ex-vocalista dos Panteras, estava sem trabalho algum.
O jeito foi recorrer ao talento como compositor e abraçar um gênero que jamais saiu de moda: a música brega.
Durante um bom tempo, Raul encheu a barriga e pagou as contas compondo para intérpretes românticos, como Jerry Adriani (Doce, Doce Amor), Diana (Ainda Queima a Esperança) e Márcio Greyck (Foi Você).
Esta última seria gravada por Roberto Carlos, que na última hora desistiu. Raul teria garantido a janta por pelo menos uma década.
Caetano e Raul pertenciam a turmas distintas.
Enquanto o autor de Coração Vagabundo tinha como ídolo João Gilberto, o roqueiro venerava Elvis Presley e Jerry Lee Lewis.
Na música Rock n Roll, Raul tira sarro do pessoal do Teatro Vila Velha, berço do tropicalismo em Salvador, de onde saíram Caetano, Gil, Gal e Tom Zé.
No Teatro Vila Velha, velho conceito de moral/ Bosta Nova pra universitário/ Gente fina, intelectual/ Oxalá, oxum dendê oxossi de não sei o quê/ de não sei o quê.
Caetano respondeu anos depois com Rock’n’Raul uma “homenagem” ao roqueiro, em que ele elogia o sarcasmo do compositor: Minha ironia/ É bem maior do que essa porcaria.
O baiano, entretanto, também cutuca a implicância do cantor com as coisas brasileiras e a veneração a tudo que é americano: Nada de axé, Dodô e Curuzu/ A verdadeira Bahia é o Rio Grande do Sul.
Provocações à parte, os dois se davam e se admiravam. Caetano visitou Raul no momento mais difícil da sua carreira, na fase de vacas magras em Copacabana, além de citar Ouro de Tolo como uma das dez melhores canções já feitas no Brasil.
Por sua vez, Raul cita versos de Tropicália, canção de Caetano, nos momentos finais de Eu sou Egoísta.
Crédito,ARQUIVO NACIONAL Casado cinco vezes, Raul escreveu músicas com quase todas suas esposas
Raul foi casado cinco vezes. Com exceção da primeira esposa, a americana Edith Wisner, compôs com todas as outras.
Um caso inédito na música brasileira — e curioso, levando-se em conta que nenhuma das quatro mulheres jamais havia feito uma música antes do casamento com Raul.
Ele pelo jeito as estimulava.
Com a também americana Glória Vaquer , compôs Love is Magick e Sunseed, ambas em inglês.
Já a terceira mulher, Tania Barreto, virou parceira em Mata Virgem e Pagando Brabo.
O casamento mais duradouro e também mais produtivo musicalmente foi com Kika Seixas. Foram cinco anos juntos e quatro canções: Geração da Luz, Coisas do Coração, Quero Mais e DDI.
Para Kika, Raul compôs Angela (seu nome de batismo), uma de suas mais belas canções de amor: Rouba do meu leite agora/ O gosto da minha vitória/ Do meu amor, do meu amor por mim.
Crédito,MIS/Foto de Frederico Mendes/Acervo Kika Seixas Durante toda a vida, Raul sonhou e propagou a filosofia de uma Sociedade Alternativa
Na teoria, tudo lindo e maravilhoso. Um lugar sem lei, sem regras, para tomar banho de chapéu e escutar Carlos Gardel.
Raul e Paulo Coelho sonhavam com uma sociedade alternativa, que funcionaria na Cidade das Estrelas, atraindo hippies e malucos de todos os tipos.
Vivia-se uma ditadura militar e qualquer lugar que reunisse uma dúzia de cabeludos já era considerado suspeito. Raul foi interrogado no Dops (órgão de repressão da ditadura); Paulo Coelho, preso e torturado.
Raul ainda teve que se explicar com os seus discípulos. Em 1973, ele havia assinado o manifesto de criação da Sociedade Alternativa: “Estamos começando um grande empreendimento e nossas portas estão abertas para qualquer ser humano que deseje unir-se a nós, não importando a sua nacionalidade, religião, raça, bandeira ou cargo. Para isso foi comprado um terreno pela Sociedade Alternativa em Paraíba do Sul, onde construiremos A Cidade das Estrelas, cuja lei será Faz o que tu queres”.
O problema é que Raul não havia comprado terreno nenhum.
Em Paraíba do Sul, interior do Rio, não havia casa, não havia teto, não havia nada.
Crédito,Acervo da família Seixas foi enterrado em Salvador, sua cidade natal; fãs causaram tumulto durante missa fúnebre
O sepultamento de Raul Seixas, morto em 21 de agosto de 1989, parou Salvador.
Nem o enterro de Mãe Menininha do Gantois, falecida três anos antes, atraiu tanta gente ao Cemitério da Saudade, no bairro de Brotas.
Os fãs, em transe, invadiram a missa realizada antes do enterro ao gritos de “Viva! Viva! Viva a Sociedade Alternativa”. O grupo entrou correndo e foi direto para cima do corpo de Raul.
A ideia dos fãs era tirá-lo do caixão e levá-lo para passear, beber e fumar. O ato de loucura só não foi adiante porque Marcelo Nova, amigo e parceiro de Raul, colocou-se em frente ao corpo e passou uma descompostura nos fãs.
Marcelo não evitou que o vidro do caixão fosse quebrado, mas impediu que Raul, mortinho da silva, saísse carregado até o bar mais próximo.
Deu em BBC
Descrição Jornalista
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