Previdência 28/06/2025 09:41
‘Não vou cortar gasto só para mostrar número no azul’, diz ministro da Previdência
Dois meses após assumir o cargo de ministro da Previdência, Wolney Queiroz afirma estar prestes a concluir uma das principais missões dadas a ele pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva: devolver o dinheiro aos aposentados lesados com descontos indevidos em seus benefícios.
Ele prevê que o dinheiro será liberado no máximo até setembro, assim que o Supremo Tribunal Federal (STF) der aval aos critérios para os pagamentos e o Congresso aprovar um crédito extraordinário.
Em entrevista ao GLOBO, o ministro, que assumiu o cargo após a queda de seu correligionário Carlos Lupi, afirma que a ordem dos ressarcimentos será a mesma em que foram registradas as reclamações dos aposentados e pensionistas pelo INSS.
Segundo Queiroz, o Estado brasileiro falhou com os aposentados, mas o episódio servirá para rever procedimentos e auditar benefícios pagos indevidamente.
E, diante da pressão do Congresso por um ajuste fiscal no governo, o ministro afirma que sua prioridade na pasta é reduzir a fila do INSS e que não vai “cortar gastos para poder apresentar número no azul”.
O senhor assumiu o ministério em meio à crise dos descontos nas aposentadorias do INSS. O que o presidente Lula lhe pediu?
O presidente me pediu para ir até as últimas consequências, ir atrás de quem fez o saque aos aposentados e não deixar ninguém no prejuízo. Estou mergulhado nessa missão.
O senhor era secretário-executivo do ministério e estava em uma reunião ainda em 2023 em que as fraudes no INSS foram denunciadas. Por que nada foi feito?
Minha função ali era ser substituto do ministro. O que a Tonia (Galleti, ex-integrante do Conselho Nacional de Previdência Social que levou o tema à reunião) fez foi um comentário de que estava sabendo de descontos. Não tinha esse caráter de denúncia para achar que, por conta daquilo que foi falado, haveria uma investigação para encontrar toda aquela coisa escabrosa que existia.
Não era isso. Tanto que essas investigações já aconteciam desde 2020 e não deram em nada, com o Polícia Federal em cima. Então, as informações não chegavam no Ministério da Previdência Social porque não interessava chegar.
Isso vai começar a reverter agora, quando começarmos a pagar (os ressarcimentos a quem teve descontos irregulares). E aí tem que haver uma disputa de narrativa. Esses descontos aconteciam desde 2018, e foi no governo do presidente Lula que eles foram escancarados e foram estancados.
Se não fosse a ação do governo, estaria acontecendo até hoje. As associações fraudulentas estão sendo investigadas, vão ser cobradas e o dinheiro vai ser devolvido.
Quando começará o pagamento?
Acho que até setembro. Quero começar assim que o Supremo Tribunal Federal responder à ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental, ação judicial no STF), o critério for validado e homologado. Será enviada uma medida provisória ao Congresso, estabelecendo crédito adicional.
Se tiver acordo no Judiciário, vai ter acordo também no Congresso. Votou, tem o dinheiro, paga. Tem um monte de gente que já está em condição de receber.
Quem vai receber primeiro?
Receberá primeiro quem entrou no sistema (do INSS) e reclamou (que teve descontos irregulares no benefício) primeiro, porque não está faltando dinheiro para pagar. Quando a gente resolver de onde tirar (o dinheiro), vai ter recurso em quantidade para pagar todo mundo. Quem entrou primeiro e conseguir finalizar o seu processo, já recebe.
Concluído esse pagamento, qual será sua próxima missão na pasta?
Quero mexer nas estruturas e fazer uma mudança efetiva dos processos. O Estado brasileiro falhou muito e em muitos momentos. As primeiras denúncias começaram em 2017 e 2018, passaram pela Polícia Federal, pelo Ministério Público, mas não foram adiante.
Diante do problema agora, há um ambiente para auditar tudo. Onde eu vejo indício, já despacho ofício para a inteligência, que atua com a Polícia Federal e o Ministério Público Federal.
Há a questão dos empréstimos consignados. Ela é uma potencial nova crise?
São produtos totalmente diferentes. Primeiro, o consignado é regulado pelo Banco Central, é fiscalizado, é lastreado por grandes instituições financeiras, não é como as associações (sindicais), onde pode haver entidade picareta. Agora, são 320 mil correspondentes bancários vendendo crédito consignado. Tem uma autorregulação que interessa ao setor fazer para poder ter segurança e ter credibilidade.
Em audiência no Senado, o senhor falou que o “ladrão entrou na casa” entre 2019 e 2022. O senhor tem algum elemento concreto para fazer essa afirmação?
Alguém encontrou essa vulnerabilidade no sistema, que não havia o batimento da informação que vinha da associação com o INSS. O INSS tomava aquilo como verdade, desde 1994 existia esse tipo de desconto. Quando alguém descobriu, lá em 2017, foi aqui, acolá, acontecendo denúncia, mas o grosso das associações que se credenciaram, das picaretas, foi nesse período, entre 2019 e 2022.
Não tem informação, e o que eu posso dizer é o que a gente vê na linha do tempo, essa escalada (de assinaturas de acordos de cooperação e concessões de descontos) nesse período. Para poder haver a escalada, a tomada do território foi ali em 2019. Ali o ladrão entrou na casa.
O STF investiga o envolvimento de pessoas com foro privilegiado. O senhor acredita que houve a participação de parlamentares?
Não tenho informação.
O senhor acredita que a CPI que será instalada sobre o tema pode descobrir?
Por mais competente que sejam os deputados e senadores para investigar alguma coisa, vai ser dentro do que já foi investigado pela CGU e pela PF. O que me preocupa, principalmente, é o risco do vazamento seletivo de dados sigilosos e um atraso no cronograma de ressarcimento. A depender do rumo da CPI, pode haver atraso no ressarcimento.
E haveria uma briga de narrativa eleitoral, que não interessa à sociedade, não interessa ao aposentado. Foi do governo Bolsonaro, foi no governo Lula, começou no governo Temer? Sou contra a CPI porque ela seria contraproducente. Mas, se ela acontecer, vamos disputar essa narrativa dentro da CPI, vou entrar preparado para isso.
O governo tem sido pressionado pelo Congresso a cortar gastos. A derrubada do aumento do IOF foi um recado neste sentido. O senhor tem sido instado a cortar gastos da pasta?
Não. Existe um entendimento que o governo passa desde o ministro Fernando Haddad (Fazenda), passando por toda a Esplanada, sobre a necessidade de ter responsabilidade fiscal. Agora, o ministério herdou um represamento artificial, ou seja, proposital para a (demora na) concessão de benefício com objetivo claro de economizar.
O presidente Lula falou em seu discurso de posse que a redução da fila é prioridade do seu governo. Eu estou comprometido com isso, com a concessão de benefício a quem tem direito. É importante que a gente diminua esse espera para menos de 45 dias, é o que foi pactuado com TCU. Hoje está em 44 dias.
Mas como enfrentar a questão da crise fiscal?
Minha função é conceder os benefícios a quem os merece. A prioridade é essa. Vamos tocar nessa toada de conceder os benefícios e que os critérios de concessão não sejam burlados. Se eles forem concedidos a quem de fato merece, paciência. Eu não vou cortar gasto para poder apresentar número no azul.
Com as mudanças na demografia e o crescimento das despesas da Previdência, o senhor vê a necessidade de uma nova reforma?
A última reforma na Previdência foi muito equivocada porque ela não levava em conta o tema da Previdência em si, e sim a economia que se geraria. O meu partido (o PDT) sempre votou contra as reformas. Quando assumi o ministério, o partido falava assim: “só se for para fazer uma contrarreforma, para voltar atrás em coisas já decididas”.
Mas o senhor vê necessidade de algum ajuste no modelo atual?
Há distorções. Se a gente tivesse no começo do governo, eu proporia que a aposentadoria rural não entrasse na rubrica da Previdência Social, porque o sistema de Previdência é eminentemente contributivo. A aposentadoria rural deve passar a fazer parte da assistência social.
Quando o senhor foi nomeado ministro, o PDT se declarou independente. Como o senhor vê isso?
O PDT tem demandas do dia a dia da política e aproveitou aquele momento para poder avançar na negociação, mas eu recebi telefonema de todos os deputados dizendo que não tinham nada contra meu nome. Vou fazer uma reunião na semana que vem com a bancada para amenizar isso. O partido vai apoiar a reeleição do presidente Lula.
O senhor assumiu o cargo há pouco mais de um mês. Vai ser candidato no ano que vem?
Não estou pensando nisso agora. Estou ocupando o cargo mais importante da minha carreira política. Se eu conseguir entregar o que eu estou pensando, construir esse ambiente novo no ministério até abril, posso ser candidato.
Descrição Jornalista
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