Agricultura 28/06/2025 17:55
EUA e Europa enfrentam queda de 40% na produção de alimentos, alertam cientistas
As regiões agrícolas mais produtivas do mundo enfrentam as maiores perdas por causa das mudanças climáticas, com áreas agrícolas importantes em países ricos podendo perder até 40% da produção de milho e trigo ainda neste século, aponta um novo estudo abrangente.
Na análise de mais de 12 mil regiões em 55 países, uma equipe de pesquisadores de instituições de ponta dos EUA e internacionais descobriu que, para cada aumento de 1°C na temperatura global, a produção mundial de alimentos pode cair aproximadamente 120 calorias por pessoa por dia, que é o equivalente a 4,4% do consumo diário atual.
O estudo, publicado na revista Nature, mostra que, mesmo quando são adotadas as chamadas estratégias de adaptação climática, as regiões conhecidas como “celeiros” estão particularmente vulneráveis e enfrentarão reduções substanciais na produção da maioria das principais culturas alimentares, o que representa uma perspectiva preocupante para a segurança alimentar global.
“É quase como se, nesse contexto, quem tem mais a perder, perde mais”, disse Andrew Hultgren, professor assistente da Universidade de Illinois e um dos autores principais do estudo.
“Nos EUA, costumamos pensar que os impactos das mudanças climáticas são mais fortemente sentidos nas regiões mais pobres do mundo. Aqui descobrimos o oposto, em que os agricultores americanos, no coração do país, estão, na verdade, entre os que enfrentam os maiores riscos para seus rendimentos futuros.”
O estudo surge logo após uma pesquisa que mostra que o aquecimento global causou um aumento sem precedentes na gravidade das secas ao redor do mundo.
Esse outro trabalho, de pesquisadores da Europa e do Reino Unido, e também publicado na Nature, indica que um recorde de 30% da superfície terrestre do planeta sofreu seca de moderada a extrema em 2022, sendo que 42% desse fenômeno foi atribuído à demanda evaporativa atmosférica, causada por temperaturas médias mais altas.
A pesquisa sobre produção de alimentos mostra um padrão contraintuitivo: as regiões que hoje são os grandes “celeiros” mundiais, com climas favoráveis, são particularmente vulneráveis justamente por conta dessas vantagens atuais.
“As regiões ricas, os ‘celeiros’ do mundo, se beneficiam dos climas muito favoráveis que possuem atualmente”, explica Hultgren. “Elas não estão tão expostas hoje a calor extremo e, portanto, não estão tão adaptadas a ele.”
Por outro lado, produtores de regiões mais quentes e de baixa renda já desenvolveram práticas mais adaptativas ao clima. “Essas regiões de baixa renda tendem a estar localizadas nas partes mais quentes do mundo”, diz Hultgren. “Elas já lidam atualmente com a exposição a extremos de calor e, portanto, já estão adaptadas a essas condições.”
O impacto sobre culturas específicas aponta como os atuais gigantes agrícolas podem ser profundamente transformados. A produção de milho enfrenta algumas das maiores perdas projetadas, com os rendimentos podendo cair até 40% em várias regiões-chave de cultivo, incluindo o cinturão de grãos dos EUA, o leste da China e a Ásia Central.
A produção de trigo nas principais regiões produtoras atuais pode sofrer perdas de 30% a 40% nos Estados Unidos, Canadá, China e Rússia.
O estudo é inovador por analisar como os produtores rurais realmente se adaptam às mudanças nas condições, em vez de se basear apenas em modelos teóricos.
“Por muito tempo, ficou uma questão em aberto até que ponto os produtores iriam se adaptar às mudanças climáticas futuras”, diz Hultgren. “Descobrimos que a adaptação é protetiva, mas apenas parcialmente; ela mitiga cerca de um terço das perdas futuras de rendimento.”
Embora o arroz pareça ser o único grande alimento básico que pode evitar perdas significativas, as perspectivas para outras culturas permanecem preocupantes; as implicações para a segurança alimentar global são complexas e de grande alcance.
“Como as regiões mais produtivas do mundo enfrentam as maiores perdas de rendimento, essas perdas acabam reduzindo a produção global como um todo em um cenário de forte aquecimento”, afirma Hultgren. “Isso pode resultar em preços de alimentos mais altos de forma geral e gerar preocupações em torno da segurança alimentar global.”
Outro detalhe é que, embora as regiões de baixa renda possam estar melhor adaptadas ao calor, elas ainda enfrentam desafios significativos.
A mandioca, uma cultura de subsistência crucial em muitos países de baixa renda, pode ter perdas de cerca de 40% na África Subsaariana. Como as populações mais pobres do mundo frequentemente praticam agricultura de subsistência – ou seja, cultivam para alimentar suas próprias famílias, e não para vender no mercado – essas comunidades podem ter ainda mais dificuldade para enfrentar essas perdas.
Os pesquisadores foram além das projeções de culturas e calcularam como essas perdas agrícolas poderiam influenciar as políticas climáticas, por meio do chamado “custo social do carbono”, uma tentativa de atribuir um valor monetário aos danos causados por cada tonelada de emissões de dióxido de carbono.
Ao calcular quanto as futuras perdas agrícolas poderiam custar à sociedade em termos econômicos, a equipe concluiu que os impactos na agricultura, por si só, poderiam adicionar entre US$ 0,99 e US$ 49,48 ao custo social de cada tonelada de CO₂, dependendo de diferentes premissas econômicas.
Richard Waite, diretor de iniciativas agrícolas do World Resources Institute, explica por que as conclusões são tão significativas.
“A redução nos rendimentos agrícolas, em um mundo de demanda crescente por alimentos, significa uma pressão ainda maior sobre as florestas remanescentes e outros ecossistemas naturais do planeta”, afirma Waite. “Isso cria um ciclo vicioso de mais mudanças climáticas, que, por sua vez, aumentam ainda mais a ameaça à agricultura e pecuária.”
Na visão de Waite, os resultados do estudo sugerem que as estratégias atuais de adaptação precisam evoluir além das abordagens tradicionais.
“Daqui para frente, o mundo precisa desenvolver culturas alimentares básicas não apenas para aumentar os rendimentos, mas também para prosperar em um clima em transformação, como a capacidade de resistir a temperaturas mais altas ou à maior variabilidade das chuvas”, afirma.
A nova pesquisa reforça a necessidade urgente de reduções mais agressivas nas emissões e de um apoio ampliado à adaptação da agricultura e pecuária, com o fracasso em qualquer uma dessas frentes ameaçando gerar fome generalizada e instabilidade social.
“Olhando além de nossas descobertas imediatas, isso deve acender um sinal de alerta em relação à segurança alimentar global e à estabilidade política internacional em um futuro de forte aquecimento”, afirma Hultgren.
Deu em Forbes
Descrição Jornalista
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