Automóveis 05/06/2025 13:35

Carro elétrico minúsculo e baratíssimo vira sensação no Japão e desbanca Toyota

Nos subúrbios rurais de Hiroshima, uma startup japonesa está tentando impulsionar o mercado de veículos elétricos do país com o menor e mais barato carro que consegue fabricar.

A KG Motors desenvolveu um modelo elétrico de um só assento que se parece mais com um carrinho de golfe futurista do que com um veículo elétrico moderno — muito menos com um carro tradicional.

Ainda assim, mais da metade das 3.300 unidades que pretende entregar em 2027 já foram vendidas antecipadamente.

Assim, isso a coloca no caminho para vender mais veículos elétricos no Japão do que a maior montadora do mundo, a Toyota, que vendeu cerca de 2 mil EVs no país durante todo o ano de 2024. Em um país onde os veículos elétricos ainda são raros, a KG Motors tenta desafiar um mito crescente: o de que “maior é melhor”.

— Os carros são simplesmente grandes demais — disse o fundador e CEO Kazunari Kusunoki. — Ver tantos carros grandes circulando pelas ruas estreitas do Japão — foi aí que tudo começou para mim.

Com menos de 1,5 metro de altura, o carrinho da KG Motors, batizado de Mibot, tem autonomia de 100 quilômetros, tempo de recarga de cinco horas e velocidade máxima de 60 km/h.

Ele custará ¥ 1 milhão, o equivalente a cerca de US$ 7.000 (antes dos impostos), quando a produção começar em outubro, na nova fábrica da KG Motors a leste da cidade de Hiroshima. Isso equivale a cerca da metade do preço do EV mais popular do Japão, o Sakura, da Nissan.

Até agora, montadoras japonesas e estrangeiras têm enfrentado dificuldades para ganhar tração no mercado de EVs japonês. Esses veículos representaram cerca de 140.000 unidades — ou cerca de 3,5% do total de vendas de automóveis em 2023 — bem abaixo da média global de 18%, segundo a BloombergNEF.

O gigante chinês BYD, por exemplo, vendeu apenas 2.223 carros no Japão em 2024 — uma pequena fração dos 4,3 milhões que entregou no mundo todo.

Enquanto isso, a Toyota e suas concorrentes japonesas divergem de outras montadoras tradicionais que apostam em um futuro totalmente elétrico.

A Toyota há muito adota uma abordagem de múltiplas vias para um amanhã mais sustentável, na qual veículos elétricos, a gasolina, híbridos e movidos a hidrogênio têm todos um papel a desempenhar. Como resultado, os híbridos a gasolina-elétrico, pioneiros das montadoras japonesas, ainda dominam o mercado.

— A Toyota disse que os veículos elétricos não são a única solução e, por ser a Toyota, os japoneses assumem que isso deve ser verdade — disse Kusunoki. — Muitas pessoas no Japão parecem acreditar que os EVs não se tornarão populares.

O mini carro elétrico da KG Motors; um só assento e velocidade máxima de 60 km/h — Foto: Reprodução/Site da KG Motors
O mini carro elétrico da KG Motors; um só assento e velocidade máxima de 60 km/h — Foto: Reprodução/Site da KG Motors

O Japão, pelo menos, tem sido mais lento em adotar a tendência global por veículos maiores e mais espaçosos. Carros pequenos sempre foram uma característica do país asiático, e os kei cars — veículos leves — chegaram até a conquistar seguidores cult em outros países.

Nos últimos anos, eles dominaram o mercado doméstico de EVs, representando 55% das vendas totais em 2023. O Sakura, da Nissan, é um kei car, com pouco menos de 23 mil unidades vendidas em 2024.

Em abril, a BYD anunciou que pretende produzir um kei car totalmente elétrico especificamente para o mercado japonês na segunda metade de 2026, enquanto a Hyundai lançou no início deste ano o Inster, um veículo de ¥ 2,9 milhões que afirma ser o EV mais barato do Japão — pelo menos entre os carros de passeio de tamanho completo.

Veículos elétricos de pequeno porte também têm ajudado a impulsionar a aceitação dos carros movidos a bateria no exterior. Na China, o maior mercado de EVs do mundo, o Hongguang Mini, da SAIC-GM-Wuling Automobile Co., chegou a ser, em certo momento, o carro mais vendido do país.

Ainda assim, com seu design de um único assento, o Mibot, da KG Motors, ocupa uma categoria minúscula e única. Segundo Kusunoki, os primeiros 300 veículos devem ser entregues a clientes em Hiroshima e Tóquio até meados do ano que vem, enquanto os próximos 3.000 serão distribuídos por todo o país.

A KG Motors afirma que terá prejuízo com o primeiro lote, mas deverá alcançar o ponto de equilíbrio no segundo. Depois disso, a empresa pretende produzir cerca de 10 mil unidades por ano. Está atualmente em processo de obtenção da certificação de segurança veicular necessária para comercializar o carro.

Custos de produção baixos

O porte da startup e sua estratégia de produção sob demanda podem jogar a seu favor. Veículos elétricos utilizam muito menos peças do que os carros convencionais a gasolina ou híbridos — mas o Mibot leva isso a um nível ainda mais extremo, consistindo basicamente de uma bateria, um motor e poucos componentes eletrônicos conectados por fiação, tudo abrigado em um chassi monobloco com quatro rodas. Com isso, os custos de produção são baixos.

Até mesmo o marketing da KG Motors se baseia na antiga carreira de Kusunoki como criador de conteúdo no YouTube.

A empresa publicou em seu site imagens do Mibot sendo testado nas estradas congeladas de Hokkaido, espremendo-se entre as casas apertadas dos bairros históricos de Hiroshima e colidindo contra paredes de concreto em alta velocidade para garantir que atenda às rigorosas normas de segurança do Japão.

Kusunoki, de 43 anos, fundou a KG Motors em junho de 2022. Ele cresceu em Higashihiroshima, uma cidade suburbana com ruas às vezes estreitas demais até para um sedã japonês. Ao longo do tempo, observou a deterioração da infraestrutura de transporte público do país, agravada pela escassez de motoristas de táxi e pelo envelhecimento e encolhimento da população.

Com a migração dos jovens para as grandes cidades, também está se tornando cada vez mais difícil para os idosos se locomoverem.

Como resultado, a KG Motors enxerga uma demanda crescente por carros compactos de um ou dois lugares, econômicos e eficientes. No início de maio, a empresa já havia recebido 2.250 pedidos, com mais de 95% vindos de proprietários de residências que já possuíam pelo menos um veículo.

— Nas áreas rurais do país, os sistemas de transporte público estão em frangalhos — disse Kusunoki. — Isso talvez seja difícil de entender para alguém que vive em Tóquio, mas chega um momento em que se torna necessário ter um carro por pessoa, não apenas por residência.

Deu em O Globo

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista