Economia 09/04/2025 06:14
EUA x China: Trump paga para ver, e Xi entra na guerra comercial. O que esperar da economia global agora?
A guerra comercial desencadeada pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, entrou em novo patamar. Após a primeira reação da China às suas “tarifas recíprocas”, ele anunciou ontem que pode impor à China novas tarifas de 50%, o que levaria as sobretaxas a um total de 104%.
Isso alimentou o pânico nos mercados acionários globais, que já haviam aberto em forte queda na Ásia como reflexo da retaliação de Pequim, anunciada na sexta-feira. Segundo a Bloomberg e cálculos da consultoria Elos Ayta, desde o anúncio do tarifaço, na quarta-feira, as perdas nos principais mercados acionários globais ultrapassam os US$ 8 trilhões.
Trump ressaltou que não vai ceder nas tarifas. Mas a Casa Branca já começou a negociar com o Japão e cerca de 50 países, segundo o secretário do Tesouro, Scott Bessent.
Na noite de ontem, o governo de Xi Jinping prometeu “lutar até o fim” caso os EUA insistam em impor novas tarifas.
“A ameaça dos EUA de aumentar as tarifas sobre a China é um erro sobre outro erro. Se os EUA insistirem em seu próprio caminho, a China lutará até o fim”, disse o Ministério do Comércio da China, que pediu diálogo para resolver disputas.
O recado vem depois de Pequim ter anunciado, na sexta-feira, que iria retaliar os EUA no melhor estilo “olho por olho”, aplicando a partir de 10 de abril uma tarifa de 34% sobre todos os produtos americanos.
— Deixamos claro, em diversas ocasiões, que pressionar ou ameaçar a China não é a maneira correta de negociar conosco. A China defenderá com firmeza seus direitos e interesses legítimos — disse à AFP o porta-voz da Embaixada chinesa nos EUA, Liu Pengyu.
O dia ontem foi de perdas nas bolsas em todo o mundo. Em Nova York, houve forte volatilidade. No fim da manhã, os índices chegaram a subir com força após rumores de que Trump estaria disposto a adiar a entrada em vigor das tarifas por até 90 dias.
O Nasdaq saltou 4,19%, o S&P 500 avançou 3,18% e o Dow Jones chegou a subir 2,19%. A Casa Branca, porém, desmentiu os rumores, e os índices voltaram a cair, encerrando em queda de 0,91% (Dow Jones) e 0,23% (S&P 500). Já o Nasdaq conseguiu fechar em alta de 0,10%.
Cristiano Oliveira, diretor de pesquisa econômica do Banco Pine, explica que a crise vem do fato de que o mercado “não consegue precificar incerteza”:
— O mercado tem incerteza sobre o quão recessivas essas políticas podem ser. Além do aspecto recessivo (das tarifas), também aparece um potencial inflacionário muito grande e, pior, persistente.
No Brasil, o Ibovespa encerrou em queda de 1,31%, aos 125.588 pontos. Segundo Luciano Telo, chefe de investimentos no braço de gestão de fortunas do suíço UBS, o Brasil acompanhou a desvalorização global por “falta de história própria”.
Ele avalia que as perdas não foram maiores porque os preços dos ativos já estão baixos. Pesou a desvalorização de commodities como petróleo e minério de ferro, pressionando papéis de Petrobras e Vale.
O barril do petróleo tipo Brent para entrega em junho perdeu 2,1%, a US$ 64,21, segundo a Blooomberg. Já o minério de ferro em Dalian (China) recuou 2,8%. A Vale caiu 1,20%, e a Petrobras perdeu 5,57% (ON) e 3,97% (PN).
— É como um espetáculo circense, e precisa acabar logo — disse à Bloomberg o ex-estrategista do JPMorgan Chase Marko Kolanovic, referindo-se ao tarifaço.
Ele afirma que a diferença entre outras crises financeiras, como a pandemia e a de 2009, e a atual é que esta foi causada, e pode ser resolvida, por uma só pessoa: Trump.
A decisão do presidente Xi Jinping de retaliar as tarifas generalizadas de Trump, anunciadas na sexta-feira, enviou uma mensagem: se os EUA querem uma guerra comercial, a China está pronta para lutar.
O país não parece estar disposto a ceder, vai aumentar os estímulos à economia doméstica e buscará depender cada vez menos dos EUA. Xi pediu ontem esforços para “liberar totalmente” o potencial de consumo do país para impulsionar o crescimento.
Wu Xinbo, diretor do Centro de Estudos Americanos da Universidade Fudan, em Xangai, expressou a postura do governo da China:
— Antes de sentarmos para negociar um acordo, acreditamos que precisamos lutar, porque o outro lado quer lutar primeiro.
Perguntado sobre a possibilidade de uma ligação telefônica entre Trump e Xi para abrir um canal de negociação, Wu resumiu a posição do governo chinês:
— Você acabou de me dar um tapa na cara. Eu não vou simplesmente te ligar e pedir desculpas.
Para o economista brasileiro Rodrigo Zeidan, professor da Universidade de Nova York em Xangai e da Fundação Dom Cabral (FDC), a reação da China tem a ver com posicionamento político:
— O certo era ficar calado e não reagir. Mas não reagir seria um sinal de fraqueza— disse Zeidan ao GLOBO, ressaltando que, diante das incertezas em relação à política comercial americana, o mais provável é que o tarifaço seja reduzido mais à frente.
Não há sinais de que a China esteja buscando um rompimento total com os EUA. Parece estar reafirmando sua posição e se preparando para um impasse prolongado, mantendo opções futuras abertas.
— A China quer transmitir aos EUA que não está intimidada e que está disposta a manter sua posição. Em vez de infligir danos significativos, o objetivo parece ser exercer pressão e incentivar o diálogo — diz Henry Gao, da Universidade de Cingapura.
O líder chinês precisa projetar força fora e dentro do país. Um grande desafio é restaurar a confiança do consumidor, abalada por uma crise imobiliária de anos que eliminou grande parte da riqueza e esfriou o crescimento do país.
— Trump e Xi estão presos em um paradoxo de pressão e orgulho. Mas aqui está o dilema: se Xi se recusar a negociar, a pressão aumentará. Se ele entrar em negociações cedo demais, corre o risco de parecer fraco — avalia Craig Singleton, pesquisador sênior da Fundação para a Defesa das Democracias.
Vários grandes bancos globais, como UBS, Goldman Sachs e Morgan Stanley, já alertaram sobre o impacto recessivo das tarifas de Trump, o que pode exercer mais pressão sobre um já combalido crescimento chinês, estimado em 4% para este ano, muito abaixo do potencial do país.
Zeidan não vê resultado possível na estratégia de Trump que não seja levar a economia global a uma recessão. Segundo o economista, o cenário atual não deve ser comparado com a guerra comercial no primeiro mandato do republicano, porque a escala do tarifaço é muito maior agora. Zeidan avalia que o incentivo de Trump à substituição de importações dos EUA tende ao fracasso:
— O problema é a incerteza. As empresas precisam de confiança para decidir investir.
A China confia que está mais preparada do que na primeira guerra comercial de Trump. O país ampliou sua rede de parceiros comerciais e reduziu a dependência dos EUA nas importações e nas exportações.
Em 2024, os EUA representaram 15% das exportações chinesas, contra 20% em 2017, antes da primeira guerra comercial.
Pequim também reduziu a dependência de importados dos EUA, que agora pretende taxar em retaliação. Atualmente são cerca de 7% do que a China compra no mundo.
Os produtos agrícolas são um exemplo, com a China reduzindo a dependência da soja americana. Os exportadores dos EUA, que já dominaram o mercado chinês, viram a participação cair para 20% em 2024, enquanto a China comprou mais do Brasil. Isso pode dar tempo para que os dois lados negociem.
— Os soldados estão mais dispostos a lutar quando o primeiro tambor de batalha soa, mas esse ímpeto começa a diminuir na segunda rodada — dz Wang Yiwei, ex-diplomata chinês.
Além da queda das bolsas globais, o dólar sobe frente às principais moedas. Às 19h30m de ontem, o índice DXY — que mede a força da divisa americana frente a uma cesta de outras seis — subia 0,43%.
No mercado de câmbio brasileiro, na máxima do dia, o dólar comercial chegou a ser negociado a R$ 5,931, logo após Donald Trump ameaçar impor mais 50% de tarifas contra a China. A moeda americana encerrou em alta de 1,29%, a R$ 5,91. É a maior cotação desde 27 de janeiro.
A escalada da guerra comercial deflagrada por Trump leva os investidores a buscarem o dólar, considerado um ativo seguro.
Alexandre Viotto, gerente de câmbio da EQI Investimentos, explica que os investidores ainda estão receosos sobre em quais ativos se refugiar.
Enquanto a política comercial pode levar os Estados Unidos a uma desaceleração econômica — e, dessa forma, pressionar o dólar —, caso a recessão se espalhe para o resto do mundo a moeda americana tende a se valorizar.
— Ninguém sabe para onde vai a política de Trump, e é isso que está deixando os mercados mais nervosos — disse Viotto.
O tarifaço de Trump também deve ter impacto sobre a taxa básica de juros da economia brasileira, a Selic, hoje em 14,25% ao ano. Para Caio Megale, economista-chefe da XP, a possibilidade de uma recessão global tira fôlego do ciclo de alta do Banco Central (BC) e pode antecipar uma pausa:
— Um cenário de recessão abre espaço para fazer uma alta na próxima reunião e parar. O BC anteciparia o “esperar para ver” — disse Megale à Bloomberg.
Ele avalia que uma desaceleração global poderia segurar os preços. Isso levaria a inflação no horizonte relevante considerado pelo BC a cair de 3,7% para cerca de 3,5%. Ainda estaria acima do centro da meta, de 3%, mas Megale pondera que muita coisa pode ocorrer até a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), em 6 e 7 de maio.
Em março, o Copom sinalizou mais uma alta, mas inferior a um ponto percentual. Segundo o Focus, que reúne projeções de mercado, a Selic deve encerrar o ano em 15%.
Para Megale, o BC já começou a construir a narrativa para uma pausa, pois os diretores têm sinalizado que as taxas estão em nível restritivo. A XP avalia que, em vez de encerrar o ciclo de alta a 15,50% a Selic poderia ficar em torno de 15%.
O presidente Lula afirmou que as reservas internacionais do Brasil são uma proteção para os efeitos da guerra tarifária. Em agenda em São Paulo, ele destacou o que chamou de “colchão de proteção” em dólar:
— Mesmo o presidente Trump falando o que ele quer falar, o Brasil está seguro porque temos um colchão de US$ 350 bilhões, que dá ao Brasil e ao ministro Fernando Haddad (Fazenda) uma certa tranquilidade — afirmou Lula em visita a um centro de distribuição em Cajamar, na Região Metropolitana de São Paulo.
As reservas internacionais do Brasil fecharam março em US$ 336,1 bilhões. Dados do Banco Central (BC) mostram que o montante caiu 7,1% em 2024, passando de US$ 355,03 bilhões no fim de 2023 para US$ 329,73 bilhões no fim do ano passado.
Em setembro de 2024, o total era de US$ 372 bilhões. A principal razão para a redução foi a venda de dólares no mercado feita pelo BC durante o último trimestre do ano passado, quando houve grande instabilidade cambial e a autoridade monetária teve que agir para segurar a cotação da moeda americana.
Anunciadas na semana passada, as chamadas “tarifas recíprocas” de Trump sobre as importações de 180 países entraram em vigor a partir do sábado. Os produtos brasileiros foram taxados em 10%. Na semana passada, Lula disse que tomaria “as medidas cabíveis para defender nossas empresas e os trabalhadores brasileiros”.
Ao lado dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad; do Trabalho, Luiz Marinho; e do Empreendedorismo, Márcio França; Lula participou ontem do anúncio de investimentos no setor de logística da empresa de comércio eletrônico Mercado Livre, em Cajamar (SP).
O presidente afirmou que quer “um país de classe média” e que isso “depende de nós, brasileiros, não dos “Estados Unidos, da China ou da Argentina”. O presidente também disse que o desempenho da economia brasileira vai contrariar as previsões:
— Outra vez, a economia brasileira vai surpreender. Porque essa gente que fica discutindo, o chamado mercado, eles não conhecem o que é o microcrédito funcionando e o dinheiro chegando na mão de milhares e milhares de pessoas. Quando vejo o Fernando Yunes (vice-presidente sênior de comércio e líder do Mercado Livre no Brasil) dizer que vai investir R$ 34 bilhões, sou obrigado a dizer para vocês que sou um cara de muita sorte porque o país passou muito tempo sem investimento — disse Lula, que embarca hoje para Honduras, onde participará da reunião da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos (Celac).
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