Drogas 10/03/2025 18:12
As sepulturas de jovens em cemitério da Escócia que dão a dimensão da crise das drogas no país
James McMillan e Lisa McCuish cresceram juntos em uma rua sem saída no alto de uma colina, com vista para a Baía de Oban. Agora eles jazem lado a lado no Cemitério Pennyfuir.
As lápides recentes do cemitério contam uma história alarmante sobre uma geração perdida nesta bela cidade turística na costa oeste da Escócia.
Oban tem apenas 8 mil habitantes, e pelo menos oito vítimas, confirmadas ou suspeitas, de uso abusivo de drogas, foram enterradas aqui recentemente. A mais jovem tinha 26 anos, e a mais velha, 48 anos.
A população da cidade é quase a mesma do número total de mortes por overdose registradas na Escócia nos últimos sete anos — de longe, a pior taxa da Europa.
As mortes levaram a apelos por medidas urgentes para combater a dependência na zona rural da Escócia, com familiares citando problemas de acesso a serviços vitais.
O secretário de Saúde da Escócia, Neil Gray, disse à BBC News que reconhece que é preciso fazer mais para combater o uso indevido de drogas nas áreas rurais.
Para a mãe de James, Jayne Donn, o pesadelo começou antes do amanhecer em uma noite gelada de dezembro de 2022, quando ela foi acordada pela campainha da porta.
“Às 4h50 da manhã, quando estava nevando, e minha árvore de Natal estava montada, a polícia veio até minha porta”, diz ela.
Os policiais foram até lá, como Jayne temia há muito tempo, para comunicar a ela que seu filho de 29 anos havia morrido de overdose.
James foi mais uma vítima de uma crise que assola a Escócia há quase uma década — e que, em 2023, causou 1.172 mortes.
“Quando era pequeno, ele era loiro, de olhos azuis e muito travesso”, conta Jayne na sala de estar da casa da família.
O James adolescente adorava “pescar, música e seu skate.”
“Como homem, não há muitas lembranças boas”, diz Jayne.
“Ele estava muito confuso. Muito irritado. Estava muito perdido.”
Crédito,Jayne Donn James McMillan, que morreu em dezembro de 2022, ao lado da mãe, Jayne Donn
O pai de James deixou a casa da família quando ele tinha sete anos.
Ele teve dificuldades na escola com dislexia e problemas de saúde mental e, mais tarde, começou a se envolver com maconha.
Ele começou a ter problemas, primeiro com os professores, depois com a polícia.
À medida que se tornava adulto, James se afastou de Oban e da família, perdendo um emprego como aprendiz de pedreiro devido à baixa assiduidade e concentração, e acabou desaparecendo na Inglaterra.
Crédito,Jayne Donn James morreu dois dias após ser libertado da prisão
Jayne diz que sabia pouco sobre o que estava acontecendo lá. Na verdade, a vida do filho estava se desfazendo.
Ele havia sido diagnosticado com transtorno de déficit de atenção com hiperatividade (TDAH), transtorno bipolar e psicose induzida por drogas.
Ele estava lutando com tendências suicidas, consumindo drogas cada vez mais pesadas e recorrendo cada vez mais ao crime.
Como resultado, ele foi detido várias vezes por acusações relacionadas a drogas, perturbação da ordem pública, arrombamentos e roubos, chegando a cumprir uma pena de dois anos de prisão.
James morreu em Glasgow, na Escócia, em 16 de dezembro de 2022, menos de dois dias depois de ser liberado da prisão, após cumprir oito meses de prisão preventiva no presídio de Barlinnie.
A mãe de James diz que não sabe os detalhes das últimas acusações que ele enfrentou, nem por que ele foi libertado, mas acredita que poderia ter sido feito mais para apoiar seu filho, pois ele havia tido uma overdose ao sair da prisão em três ocasiões anteriores.
Uma fonte do Serviço Penitenciário Escocês destacou que as decisões tomadas ao final de um período de prisão preventiva são de competência dos tribunais, não da prisão.
Jayne lista uma rede de organizações que atenderam seu filho: instituições de caridade, autoridades locais, o NHS, sistema público de saúde britânico, serviços de tratamento de dependência, provedores de moradia, entre outros.
Mas ela ressalta: “Ele foi solto em uma cidade que não conhecia, sem casaco, sem dinheiro e sem ninguém ciente”.
“Ele durou menos de 36 horas.”
Crédito,MKC Photocreations Lisa McCuish cresceu em Oban
Lisa McCuish cresceu ao lado de James em uma rua com vista para a Baía de Oban, onde as balsas da Caledonian MacBrayne fazem o trajeto de ida e volta para as ilhas Hébridas.
Recentemente, Oban foi nomeada cidade do ano da Escócia por uma organização que promove comunidades menores.
Hoje, a irmã de Lisa, Tanya, está sentada na sala de estar de Jayne, com lágrimas nos olhos, se lembrando da irmã como “uma pessoa radiante” com “um coração de ouro”.
“Lisa nunca se envolveu com drogas, sabia? Ela não era assim”, diz Tanya.
As coisas começaram a desandar depois que Lisa recebeu uma prescrição de Diazepam, remédio que normalmente é usado para tratar ansiedade, convulsões ou espasmos musculares.
“Ela acabou comprando o medicamento nas ruas porque achava que precisava de mais”, lembra Tanya.
“Ela continuava dizendo que precisava de mais ajuda, mais apoio.”
Foi então que, segundo ela, sua irmã começou a usar heroína.
Lisa teve uma parada cardíaca em 13 de setembro de 2022, e morreu quatro dias depois no hospital em Paisley. Ela tinha 42 anos.
Ela tinha medicamentos prescritos no organismo, e também Etizolam, substância análoga à benzodiazepina, comumente conhecida como Valium de rua, pois é frequentemente vendida ilicitamente.
Tanya e Jayne nos levam ao local em que ambos seus entes queridos estão sepultados, apontando para outros túmulos próximos onde estão enterradas vítimas recentes do uso de drogas.
Entre elas, está o melhor amigo de James, que jaz ao lado dele e de Lisa. Ele tinha 30 anos quando morreu de overdose.
“É horrível pensar que há pelo menos 10 por aqui que conseguimos lembrar”, diz Jayne.
Não há um registro oficial de quantas vidas foram ceifadas pelas drogas em pequenas comunidades como Oban.
Conseguimos confirmar que pelo menos oito das mortes ocorreram em apenas um ano e meio, e estavam relacionadas a drogas, ou ainda estão sendo investigadas.
Essa é a realidade da crise de mortes por drogas na Escócia em apenas uma pequena comunidade, e tanto Tanya quanto Jayne dizem que o governo escocês precisa fazer mais para salvar vidas.
“Pessoalmente, acredito que grande parte da dependência tem a ver, antes de tudo, com a saúde mental”, afirma Tanya.
“Não há continuidade no apoio dos serviços de tratamento de dependência ou dos serviços de saúde mental. Não há nenhuma ligação.”
Jayne, que também trabalha na assistência a dependentes de drogas, diz que passou anos tentando trazer James para Oban, onde ela achava que ele teria mais chances de recuperação e sobrevivência.
Um desafio em particular, segundo ela, foi o fato de o Conselho local de Argyll e Bute ter oferecido a James moradias em Dunoon e Helensburgh — ambas as cidades ficam a cerca de duas horas de distância —, tornando muito difícil para sua família apoiá-lo.
A autoridade local afirmou que havia oferecido serviços “apropriados” a James.
O conselho acrescentou que tinha serviços de moradia em toda a área, mas nem sempre podia atender a “critérios individuais e, às vezes, variáveis”.
O secretário de Saúde da Escócia, Neil Gray, prestou suas profundas condolências a ambas as famílias, e reconheceu que os serviços rurais relacionados ao uso de drogas poderiam ser melhorados.
“Acho que os dois casos que você destacou me dizem que há mais coisas que podem ser feitas”, ele afirmou.
“Reconheço que nem tudo está disponível em todas as partes da Escócia.”
“Apoiamos parcerias contra álcool e drogas em toda a Escócia, sejam elas em áreas rurais ou urbanas”, acrescentou Gray.
“Gostaria obviamente que continuássemos a fazer mais para garantir que haja acesso a instalações e serviços nas zonas rurais e insulares.”
Para Justina Murray, CEO da organização beneficente Scottish Families Affected by Alcohol and Drugs, os problemas não estão na estratégia ou no financiamento, mas na cultura e na prestação de serviços, especialmente nos serviços para tratar a dependência do NHS.
“As pessoas querem serviços que estejam em sua própria comunidade, que possam acessar quando precisarem, que sejam recebidas na porta por um rosto amigável”, diz ela.
“Que sejam tratadas com dignidade e respeito.”
“Essa não é necessariamente a experiência que você vai ter ao se envolver com o NHS ou com um serviço de tratamento obrigatório.”
De acordo com os dados mais recentes disponíveis, divulgados em setembro de 2024, há capacidade para 513 leitos de reabilitação residencial na Escócia, em 25 unidades.
Apenas 11 destes leitos estão disponíveis em áreas rurais consideradas muito remotas pelo governo escocês, embora a maioria das unidades aceite encaminhamentos de qualquer parte da Escócia.
Pergunto a Jayne e Tanya sobre o argumento de que os indivíduos e suas famílias, e não o Estado, deveriam assumir mais responsabilidade por suas próprias escolhas.
“Ninguém se propõe a ser um viciado em drogas”, responde Jayne.
“Ninguém escolhe isso. O problema de saúde mental foi o que levou James a tentar fugir da realidade.”
“Ele então não tinha mais capacidade de fazer suas escolhas. Ele não era mais James.”
“Estes são adultos vulneráveis que não conseguem se proteger de perigos ou danos”, acrescenta Tanya.
“Por que não se está fazendo mais?”
“Alguma coisa precisa mudar”, concorda Jayne.
“Estamos perdendo muitos jovens.”
Deu em BBC
Descrição Jornalista
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