Terra 14/01/2025 12:43

O que gelo de 1,2 milhão de anos retirado das profundezas da Antártida pode revelar

Cientistas perfuraram um núcleo de gelo a quase três quilômetros de profundidade no solo antártico. Sua análise pode fornecer respostas sobre a história do clima terrestre; entenda

Uma equipe internacional de cientistas alcançou um marco histórico na pesquisa climática ao perfurar gelo a 2.800 metros de profundidade, num local conhecido como Pequeno Domo C, na Antártida.

O projeto Beyond EPICA – Oldest Ice, financiado pela União Europeia, promete revelar registros atmosféricos e climáticos de até 1,2 milhão de anos, estendendo o conhecimento sobre o passado da Terra.

“Este é o registro contínuo mais longo do clima da Terra obtido de um núcleo de gelo, possibilitando entender a relação entre o ciclo do carbono e a temperatura do planeta”, explicou em comunicado Carlo Barbante, coordenador do projeto do Instituto de Ciências Polares do Conselho Nacional de Pesquisa da Itália (Cnr-Isp), que envolveu 12 instituições científicas de 10 países europeus.

Perfurando o gelo

Após mais de 200 dias de trabalho em quatro temporadas de campo, a equipe realizou a perfuração em condições extremas. O Pequeno Domo C está localizado a 3 quilômetros e 200 metros de altitude no planalto central da Antártida, onde as temperaturas médias chegam a -35°C durante o verão.

Para encontrar o local exato para perfurar o gelo, os cientistas utilizaram a tecnologia de radar de eco de radiofrequência, que permitiu mapear com precisão a espessura do gelo, ajudando a identificar as camadas mais antigas e preservadas, onde poderiam ser encontrados registros climáticos de milhões de anos.

O uso do radar também ajudou a evitar locais onde o gelo poderia ter derretido previamente devido ao calor do manto terrestre, um problema potencial quando se lida com camadas de gelo espessas.

Análises preliminares indicam que os primeiros 2.480 metros do núcleo concentram registros climáticos detalhados, com até 13 mil anos comprimidos em cada metro de gelo.

“Encontramos exatamente o registro previsto, no intervalo de 0,8 a 1,2 milhão de anos, entre 2.426 e 2.490 metros de profundidade”, afirmou Frank Wilhelms, cientista responsável pelo campo que ocorreu entre os meses de novembro e janeiro. Esses dados expandem o registro do núcleo de gelo do EPICA de 20 anos atrás, coletados entre 1996 e 2008.

Além de desvendar mudanças climáticas durante o Pleistoceno Médio, período entre 900 mil e 1,2 milhão de anos atrás, o núcleo pode revelar informações sobre o gelo mais profundo, que apresenta características deformadas e com estrutura alterada devido ao derretimento e recongelamento.

Esse gelo foi provavelmente misturado e recondicionado devido a movimentos dinâmicos do gelo antártico e pressões internas do manto. O estudo dessas camadas também pode fornecer pistas importantes sobre a história da glaciação na região, além de testar hipóteses sobre os processos que moldam o gelo sob o continente antártico.

Amostras de gelo serão enviadas para análise na Europa — Foto: PNRA/IPEV
Amostras de gelo serão enviadas para análise na Europa — Foto: PNRA/IPEV

As amostras serão transportadas para a Europa em contêineres refrigerados, a bordo do navio Laura Bassi, mantendo uma cadeia de frio rigorosa de -50°C.

Esses containers foram projetados especificamente para evitar qualquer variação de temperatura que pudesse afetar os dados do núcleo, garantindo que as amostras cheguem intactas ao seu destino.

“Para alcançar esse objetivo, foi desenvolvida uma estratégia que envolveu o projeto de containers de frio especializados e o agendamento preciso dos recursos aéreos e navais do Programa Nacional de Pesquisa Antártida (PNRA)”, explicou Gianluca Bianchi Fasani, chefe de logística do projeto.

A análise do núcleo promete oferecer respostas sobre o comportamento do clima e o impacto de ciclos glaciais, contribuindo para o avanço no entendimento das mudanças climáticas globais.

Deu em Galileu

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista