Partidos Políticos 18/12/2024 19:51

Os partidos políticos são confiáveis?

Historicamente no Brasil os partidos políticos não gozam de muita credibilidade. São as instituições que apresentam os mais baixos níveis de confiança social entre todas as instituições pesquisadas.

Historicamente no Brasil os partidos políticos não gozam de muita credibilidade. São as instituições que apresentam os mais baixos níveis de confiança social entre todas as instituições pesquisadas.

É o que constatam as pesquisas do IPEC (Inteligência em Pesquisas e Consultoria estratégica) que desde 2009 pesquisa o Índice de Confiança Social (ICS) de 20 instituições.

E também revelado em outras pesquisas que expõem o desencanto e indiferença das pessoas em relação aos partidos políticos, como Barômetro das Américas (LAPOP) que realiza pesquisas de opinião pública em mais de 30 países das Américas e Caribe realizado pelo Projeto de Opinião Pública da América Latina da Vanderbilt University (EUA) e desde 2006, como consta em sua página na internet “tem entrevistado amostras representativas da população brasileira sobre diversos temas relacionados a governo, eleições e comportamento político como confiança nas instituições, tolerância política e participação em atividades políticas” e o World Values Survey disponibiliza diversas publicações e dados de pesquisas.

Em relação ao IPEC, em 2024 foi publicado o resultado de mais uma pesquisa com entrevistas realizadas entre os dias 4 e 8 de julho, com 2.000 entrevistas distribuídas em 129 municípios (com margem de erro máxima estimada em dois pontos percentuais).

Trata-se de uma pesquisa quantitativa com a aplicação de questionários estruturados, por meio de entrevistas realizadas com pessoas que tem 16 anos ou mais. E apresenta dados do que chama de Evolutivos por gênero, idade, classe socioeconômica, região, religião, escolaridade e raça/cor.

Numa escala de 0 a 100, os partidos têm 33 (variou ao longo da série, com 16, menor índice em 2018 a 34, o maior, em 2023, mas sempre dentro do considerado como de “quase nenhuma confiança”).

Desde o início da série em 2009 o primeiro lugar têm sido o Corpo de Bombeiros, com 87 pontos – mantidos nos três últimos anos – seguidos pela Polícia Federal, com 71 (passou a ser contabilizados a partir de 2016), Escolas Públicas (70), Igrejas (69) e Forças Armadas 68, entre os cinco primeiros, e os partidos políticos, o último (33)

(Entre as 20 instituições, as duas piores avaliadas são o Congresso Nacional e os partidos políticos).

Embora tenha havido uma melhora em 2023, com 34 pontos, crescendo quatro em relação ao ano anterior (2022) e ter sido o maior da série histórica, manteve o último lugar.

É importante ressaltar que entre 2015 e 2018, atingiu os índices mais baixos, 16 e 18 pontos respectivamente (da mesma forma, o Congresso Nacional, com 18 e 22 pontos respectivamente, os menores da série, embora tenha passado de 36 em 2022 para 40 em 2023 e 2024, ou seja, com Índice de Confiança Social um pouco maior do que os partidos políticos).

A pesquisa de 2024 também revelou que o índice de confiança no presidente da República foi o maior desde 2012, 50 pontos, nove a mais do que o registrado por Bolsonaro em 2022.

Em relação aos partidos políticos, não é um problema atual. Trata-se de uma relação de desconfiança construída historicamente.

Em 2001, o cientista político norte-americano e pesquisador do Helen Kellogg Institute for International Studies da Universidade de Notre Dame, Scott Mainwaring, publicou no Brasil o livro Sistemas partidários em novas democracias: o caso do Brasil (Editora FGV) resultado de uma pesquisa (e extensa revisão bibliográfica) na qual constata, entre outros aspectos, a debilidade dos partidos políticos brasileiros e identificou no sistema eleitoral e partidário o que chamou de “elementos que prejudicam a constituição dos partidos, a consolidação de suas bases sociais e de sua própria identidade, a sua capacidade de exercer a representação política e o governo”.

Para ele, diversas características do sistema partidário e eleitoral contribuíram para a formação de um sistema multipartidário fragmentado em que o partido do presidente não tem maioria no Congresso (daí a necessidade de construir uma base de apoio, fazendo concessões, para garantir a governabilidade) e nesse sentido, a situação do presidente da República em minoria permanente leva facilmente a impasses entre o Executivo e o Legislativo, que resultam em imobilismo político e revelam as dificuldades que esse tipo de sistema tem para lidar com uma situação na qual os presidentes não dispõem de sustentação estável no Congresso Nacional, ficando sempre à mercê ou refém do Parlamento, que impõe às condições de apoio (como se revela atualmente nas negociações sobre as emendas parlamentares).

Para Maiwaring, há uma baixa institucionalização do sistema partidário, com uma histórica ausência de participação política dos cidadãos nas instâncias representativas, que tem suas raízes históricas no clientelismo, na existência de uma cultura política patrimonialista – que concebe a política como a extensão do espaço privado – no corporativismo e na oligarquização do sistema político, associado à corrupção e nepotismo levam à prevalência de interesses particulares, e que como consequência, contribui para o descrédito e falta de legitimidade dos partidos políticos, além de também contribuir para a instabilidade democrática.

Se houve, como se constata hoje, a ampliação do poder do parlamento, a ponto de haver quem considere na prática existir um semipresidencialismo, leva a permanentes negociações entre o Executivo e o Legislativo, mas que essencialmente mantém muito das características de suas raízes históricas, do sistema partidário e eleitoral que se construiu ao longo do tempo.

Para o cientista político Wanderley Guilherme dos Santos (1935-2019), em um dos seus muitos livros, Crise e Castigo: partidos e generais na política brasileira publicado em 1987 (IUPERJ) os partidos monopolizam a função de representação política e consolidam burocracias não permitindo a participação efetiva em suas instâncias decisivas sequer dos seus filiados e nesse sentido o monopólio de representação, mesmo que democrático, ou seja, os representantes sendo eleitos através de eleições, não garante que elas desempenham suas funções de forma democrática.

Até porque, com a ampliação do número de partidos, surgem (e se mantém) legendas que tem servido basicamente aos interesses de seus dirigentes.

Assim, sem partidos efetivamente democráticos, a democracia na sua dimensão representativa fica comprometida porque se inserem em práticas políticas tradicionais como o clientelismo, o nepotismo, o personalismo e o patrimonialismo.

Mas não é um problema especifico do Brasil, mas das democracias representativas em geral, e a desconfiança nos partidos se expressam em altos índices de abstenções, votos em brancos e nulos.

Em relação à América Latina, em 2023 foi publicado mais um relatório do Latinobarômetro (Corporação com sede em Santiago (Chile), que faz pesquisas anuais desde 1996 e atualmente em 18 países da América Latina), intitulado Recessão democrática na América Latina, e entre as análises constantes no Relatório, estão os partidos políticos.

Na pesquisa foram aplicados 19.906 questionários em 18 países (exceção da Nicarágua onde há a justificativa de que não foram aplicados os questionários em função da situação de instabilidade política do país) e se perguntou pela primeira vez se os partidos políticos funcionam bem e a resposta foi que não funcionam para 77% dos entrevistados.

O máximo de acordo com a frase foi no Uruguai com 38% (o que significa afirmar que para 62% não funciona bem), enquanto nos demais países os índices chegaram a 80% (no Peru, nove entre dez pessoas disseram estar em desacordo com a frase).

Os índices de baixa credibilidade dos partidos e a de sua imagem se inserem no que o Latinobarômetro qualifica como recessão democrática, que se expressa no baixo apoio à democracia, no aumento da indiferença ao tipo de regime, a preferência (e atitudes) a favor do autoritarismo.

Na análise sobre os partidos políticos, se referem ao personalismo (de presidentes e candidatos a presidentes) que “termina fragilizando os partidos” e ainda mais que “esta debilidade conduz a atomização do sistema de partidos e o abaixamento de sua imagem e legitimidade”.

O fato é que os dados revelam a baixa credibilidade dos partidos políticos em todos os países. Não há nenhum na América Latina no qual os cidadãos percebam majoritariamente que os partidos funcionam bem.

No entanto, a pesquisa também revela que há um grande percentual de entrevistados que afirmam que não pode haver democracia sem partidos políticos.

O problema, portanto, não é a existência de partidos, mas a qualidade dos partidos existentes nestes países, de seus representantes (O Uruguai, com 62%, seguido por Costa Rica, com 59% são os que têm maior número de pessoas que afirmam que sem partidos políticos não é possível haver democracia).

Mas um dado importante é que entre 2000 e 2013 havia uma parcela maior de apoio à democracia e suas instituições, para iniciar ,desde então, uma queda sistemática.

Em relação aos partidos políticos, em dez anos, entre 2013 e 2023 houve uma diminuição do percentual de pessoas que apoiavam os partidos, ou seja, houve uma desvalorização dos partidos (inseridos na referida recessão democrática, um rebaixamento da sua imagem, que resulta na sua baixa credibilidade). É importante registrar que há variações entre os países, sendo o Uruguai o país que tem o maior percentual de apoio à democracia e aos partidos e Honduras, o menor.

Mas, o aspecto importante é que a maioria considera que não pode haver democracia sem partidos, embora em sete países cerca da metade dos cidadãos ou mais, não creem que os partidos políticos sejam indispensáveis para a democracia: Panamá (64%), Colômbia (60%), Equador (59%), México e Paraguai (58%), Peru (54%) e Guatemala que tem o menor índice (50%).

E nesse sentido, no que o relatório qualifica como recessão democrática na região, há riscos para a democracia quando existe um baixo apoio, o aumento da indiferença em relação ao tipo de regime, baixa credibilidade dos partidos políticos e uma preferência pelo autoritarismo, o que coloca a importância de se analisar a insuficiência do processo democrático, em especial quanto à resolução de problemas essenciais do país.

Como a permanência, em que pese todos os esforços de governos democráticos como o atual no Brasil, das desigualdades e que se materializa em atitudes e comportamentos de desvalorização das instituições da democracia representativa, e assim a criação de um ambiente socialmente instável, politicamente polarizado, que tem pavimentado as ações e o crescimento da extrema direita e impõe a necessidade de reformas institucionais e especialmente mudanças de caráter estrutural no sentido de garantir a efetiva igualdade de todos perante a lei, a justiça, a dignidade e a justa distribuição da riqueza.

Deu em Vero

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista