História 21/07/2022 17:22

Começa a restauração do prédio histórico de A Samaritana, na Ribeira

"Me sinto muito feliz em realizar este projeto, contribuindo para a restauração do histórico bairro da Ribeira", disse Roberto Serquiz na instalação do canteiro de obras.

O empresário Roberto Serquiz instalou hoje, com a empresa de engenharia contratada, o canteiro de obras para iniciar a reconstrução e restauração do histórico prédio da antiga A Samaritana, no bairro da Ribeira.

Após a conclusão da obra o prédio será transformado em local de exposições, cafeteria e ponto de encontro dos natalenses.

A obra mostra, na prática, é uma iniciativa moderna e comprometida com o renascimento da Ribeira e com a preservação do patrimônio histórico de Natal.

A restauração do secular prédio de A Samaritana é uma parceria com o espólio da família Serquiz, (do qual Roberto é o inventariante), e Unimed, através da Lei Djalma Maranhão.

Foi neste prédio onde nasceu o Diário de Natal, logo após ser incorporado ao Grupo liderado pelo jornalista Assis Chateaubriand.

O prédio conta um pedaço importante da história do jornalismo do RN, segundo a pesquisa de Ilanna Paula Revorêdo

A primeira etapa será de recuperação da estrutura e restauração das fachadas. Em seguida a cobertura parcial do prédio.

O projeto estabelece condições para instalar um café e espaços livres para visitação. A obra será concluída em 2023.

Roberto Serquiz com os operários e engenheiros, na manhã desta quinta feira, lançando o canteiro de obras de A Samaritana.

Conheça a história do prédio:

Histórico do Bem (A SAMARITANA)

Figura 1: A SAMARITANA VISTA DA PRAÇA AUGUSTO SEVERO, DÉCADA DE 40.

FONTE: ROSTAND MEDEIROS

Construído com o objetivo de abrigar uma loja de tecidos, o proprietário e empresário Serquiz Elias, de origem libanesa, ergue o prédio no ano de 1916, tendo em sua fachada o letreiro com o nome da loja “A SAMARITANA”, isso se torna algo marcante e simbólico como referência nos dias atuais.

Certamente a fachada que resiste ao tempo e nela cresce uma árvore, é um verdadeiro símbolo do lugar. Prédio de estilo eclético, com características muito marcantes, se destaca diante de outras construções existentes na sua época.

Algumas características são peculiares como o fato das bandeirolas serem separadas das portas e as 3 esquadrias centrais do pavimento superior, que juntas formam, um arco. Seriam estes detalhes provenientes de sua origem libanesa?

O fato é que, naquela época, eram poucas as construções na cidade que carregavam esses detalhes.

Podemos comprovar isso através da tese de Viegas (2018), que chegou a fazer o inventário do centro histórico com mais de 1600 edificações, onde apenas cerca de 5 prédios constavam com essas mesmas características.

No interior do prédio podemos encontrar ainda algumas referências que resistiram ao tempo e provavelmente tem a ver com a origem do proprietário, como o piso original, ainda conservado em parte da caixa da escada, um ladrilho hidráulico nas cores vermelhas e creme e as bandeirolas da esquadrias do pavimento superior, que são voltadas para os fundos do prédio e que apresentam um muxarabi em madeira.

Figura 2: RUA DR BARATA

FONTE: https://tokdehistoria.com.br/2013/10/03/401-fotos-antigas-de-natal/

No n° 232 existia uma papelaria, da firma R. Dourado, que foi destruída por um incêndio, sendo construído no local, pelo Sr. Serquiz Elias, o prédio hoje existente, onde instalou a sua loja A Samaritana, passando a ser administrada, com o seu falecimento, pelo seu genro Sr. Neif H. Chalita, tendo pouca duração porque o Sr. Chalita faleceu poucos anos depois.

O local veio a ser ocupado pelas Loja Paulista, vinda do N° 104, da Tavares de Lira.Hoje denominam-se Casas Pernambucanas e funcionam em prédio recentemente construído e em alto desenvolvimento. […] Neste número, encontra-se a firma Laete Gaspar Costa, especializada em prestação de serviço Consul.”(ANDRADE, 1989, p. 86)

Segundo Andrade (1989), a loja logo passou a ser alugada para famosa Loja Paulista, que mais tarde se tornou a conhecida Casas Pernambucanas.

A Loja Paulista ocupava o térreo e vendia o mesmo seguimento de produtos da loja “A SAMARITANA”: tecidos.

Não foram encontrados registros de alteração da estrutura da loja para esse segundo uso. No pavimento superior existiam diversas salinhas, no livro de Augusto Severo Neto (1985) “ONTEM VESTIDO DE MENINO”, podemos comprovar a existências de várias salas que eram locadas para as mais diversas finalidades. Vejam o trecho a seguir, onde o autor descreve a lembrança de uma experiência vivenciada no prédio, a época de sua infância.

Atingia-se o primeiro andar das “lojas paulistas” por uma comprida escada de madeira rangedeira que, acredito, ainda existe. Pé direito violentamente alto. Degrau a não mais acabar. Lá em cima, Sylvio de Souza, dentista. […]

Nas outras salas do sobrado da Paulistas estavam os consultórios do Dr José Maria Neves, Antônio Muniz, Alfredo Bahia Monteiro e o outro

dentista, Giuseppi Leite.[…] Havia ainda o estúdio de Rubens , fotografo da moda, que morreu no naufrágio do Baependi, primeiro navio brasileiro torpedeado em nossas costas, no início da Guerra. Entre outras coisas, havia no estúdio de Rubens um retrato colorido e muito expressivo de um velho alquebrado, de olhar mortiço e triste.

Debrucei-me à sacada daquele primeiro andar, ouvindo o ruído dos instrumentos de Sylvio de Souza como um retinir de espadas em duelo, o zunir da broca do Giuseppi, sincronizado com os gemidos do paciente/ vítima e olhando do alto a velha Doutor Barata. […] (SEVERO NETO, 1985, p. 50 – 52)

Por essa descrição podemos perceber que existiam pelo menos 7 salas no pavimento superior para locação para as mais diferentes finalidades, sendo em sua grande maioria, para prestação de serviços.

É possível encontrar anúncios nos jornais da época, anúncios de médicos, advogados, empresas de transportes, entre outros. Foram encontrados registros da década de 20 até a década de 60. Muito pouco provável coexistir com aluguel para habitação, mas existem registros que relatam a existência de um “pensionato para gente simples”.

Segundo registro fotográfico, de Eduardo Alexandre Garcia (postando em seu facebook em 06/04/2013) com indicação da década de 60 em que destaca a fachada da edificação, podemos perceber a fachada muito bem conservada e muito provavelmente ainda em seu estado original. Onde percebemos a existência de portas almofadadas e bandeirolas por trás do gradil da bandeirola no primeiro pavimento. Identificamos ainda a existência da 5ª porta, hoje fechada.

As portas também foram alteradas, sendo substituídas por esquadrias mais simples do tipo fichas.

Figura 3: FACHADA DA SAMARITANA DÉCADA DE 60

Ainda durante o advento da II Guerra, período em que a cidade de Natal fervilhava de novidades e de americanos, vindo para cá junto com a base aérea “Parnamirim Field”, a rua Dr. Barata era o endereço nobre da cidade e o comércio chique se encontrava lá.

A Loja Paulista era endereço certo para adquirir as melhores fazendas com o mais delicado toque, no pavimento superior renomados médicos, advogados, fotógrafos entre outros ocupavam o nobre endereço para prestar seus serviços e uma dessas salas foi locadas para os jovens Djalma Maranhão, Aderbal de França, Rivaldo Pinheiro e Waldemar Araújo que, por ocasião da II Guerra, resolveram criar um jornal independente e instalaram a redação do seu jornal nessa pequena sala.

Todo o jornal era escrito e editado lá, mas com a ajuda de Edilson Varela que era, na ocasião, diretor de “A REPÚBLICA”, o jornal oficial do governo, lá eles imprimiam seu jornal para ser distribuído na cidade.

O nome era “O DIÁRIO”, permaneceram na mesma sala até o ano de 1941, quando o jornal adquiriu mais notoriedade e foi vendido a Ruy Moreira Paiva, por cinco mil cruzeiros e mais tarde ao Grupo Chateaubriand, quando passou a ser chamado de “O Diário de Natal”.

Foram encontrados registros da permanência da Loja Paulista até a década de 60. No ano de 1967 já existem registros da loja DISMACOL, que vendia material de construção.

Já no ano de 1972, existem registros de dívidas da loja com o estado e no ano de 1980, de um leilão de materiais de construção com o endereço do prédio.

Nesse período não foram encontrados registros sobre o pavimento superior, podendo ter sido locado à loja DISMACOL ou ter sido destinado a outros usos desconhecidos.

Teria acontecido um incêndio no prédio e destruído boa parte de sua estrutura.

De fato, durante o levantamento, foram encontradas algumas das madeiras ainda existentes na edificação, de aparência retorcida e escurecida, muito parecido com madeiras queimadas.

Esse incêndio, segundo relato do Sr. Lula Belmont (funcionário do Café Teatro, em entrevista no dia 20.08.2020), que trabalhou com o Sr. Arruda Sales e inaugurou no prédio o FRENEZZI CAFÉ TEATRO, que teria sido o primeiro espaço para eventos voltado ao público LGBT na cidade, que teria ocorrido alguns anos depois do café ter fechado.

Muito provavelmente, a reforma para adequação da edificação ao Café Teatro, foi um dos motivos que mais ocasionou alterações na edificação, tendo boa parte do seu piso original modificado entre várias outras descaracterizações, no tocante à integridade da edificação, prejudicando sua preservação.

O empreendimento fez bastante sucesso, mas teve vida curta. Segundo Costa “O Empreendimento, porém, não durou muito tempo.

Fechou em 1983, devido a problemas de infra-estrutura e também, é claro, devido à falta de incrementos por parte dos órgãos públicos ligados a questões do Patrimônio Histórico e Cultural”. (1998, p. 140)

Nesse mesmo período foi identificado na entrevista com o Sr. Lula Belmont (funcionário do Café Teatro, em entrevista no dia 20.08.2020), que no pavimento superior funcionou uma espécie de motel, que era administrado pelo Sr. Francisco e que até o ano de 2020, possuía estabelecimento de uso similar no prédio ao lado.

Infelizmente o Sr. Francisco morreu duas semanas antes da descoberta dessa informação, em decorrência da COVID-19, o que impossibilitou uma entrevista com mesmo e com ele se foi mais um pouco da história da Ribeira.

Segundo Júlio Cesar de Andrade, o último registro de funcionamento do prédio registrado no seu livro ao ano de 1989, foi da firma especializada em serviço Consul, Laete Gaspar Costa. (ANDRADE, 1989. p. 86) Ilanna Paula Revorêdo

Pesquisa: Ilanna Paula Revorêdo

Ricardo Rosado de Holanda


Descrição Jornalista