O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, voltou a culpar Roberto Campos Neto, que deixou a presidência do Banco Central em 31 de dezembro de 2024, pela elevação da taxa básica de juros, a Selic.
“Essa alta, sendo muito honesto, quem é do ramo sabe, foi contratada na última reunião da qual participou o Roberto Campos, em dezembro [de 2024]. É como se tivesse estabelecido uma contratação futura da taxa. Não dá para dar cavalo de pau em política monetária, vai perder credibilidade. Tem de ter muita cautela”, disse o chefe da equipe econômica em entrevista à TV Record na terça-feira, 24.
Para Haddad, o percentual da Selic está em um patamar muito restritivo.
“Estou preocupado, evidentemente. É uma taxa de juros muito restritiva, muito acima da inflação projetada. Está muito restritiva. Obviamente que as pessoas, naturalmente, se preocupam”, afirmou.
Aos fatos
De fato, a última reunião do Copom presidida por Campos Neto, em dezembro de 2024, contratou duas elevações da Selic de 1 ponto percentual.
Todavia, os aumentos precisavam ser confirmados nas reuniões posteriores, então presididas por Galípolo, ex-número 2 de Haddad no Ministério da Fazenda.
Além disso, foram realizadas mais duas reuniões do Comitê de Política Monetária, que não seguiram diretiva alguma deixada por Campos Neto.
Nas reuniões de 6 e 7 de maio e 16 e 17 de junho, o Copom decidiu elevar a Selic em 0,5 e 0,25 ponto percentual.
Quem é do ramo sabe
Após a entrevista de Haddad, o economista Alexandre Schwartsman escreveu no X:
“O esporte favorito de Fernando Haddad: botar a culpa nos outros.”
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Enfim um petista culpando Campos Neto
Campos Neto já se foi há tanto tempo que os petistas nem se animam mais a culpá-lo pelas altas na Selic. O líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (RJ), reclamou, mas sem conseguir atribuir ao indicado por Jair Bolsonaro influência na decisão — como vinha fazendo após as últimas reuniões do Copom.
“Não dá pra aceitar como normal o novo aumento da Selic pelo Banco Central. A taxa de 15% é indecente, proibitiva e desestimula investimentos produtivos. É a transformação do Brasil no paraíso dos rentistas: quem vive de juros ganha, quem trabalha perde”, protestou o petista.
“O Banco Central não pode ignorar o impacto fiscal de sua política monetária. Se dizem que a dívida preocupa tanto, por que a política de juros não considera o custo que ela própria impõe às contas públicas?”, seguiu o deputado federal, sem apontar um culpado específico.
Quem também reclamou sem apontar o dedo para ninguém específico foi a ministra das Relações Institucionais de Lula, Gleisi Hoffmann.
“No momento em que o país combina desaceleração da inflação e déficit primário zero, crescimento da economia e investimentos internacionais que refletem confiança, é incompreensível que o Copom aumente ainda mais a taxa básica de juros”, disse a petista em seu perfil no X, acrescentando que “o Brasil espera que este seja de fato o fim do ciclo dos juros estratosféricos”.
Os juros
A Selic chegou, na quarta-feira, 18, a 15% ao ano, ao maior patamar em 19 anos. Boa parte da culpa é de Lula (PT) e Haddad, como destacou o Copom, ao dizer que “segue acompanhando com atenção como os desenvolvimentos da política fiscal impactam a política monetária e os ativos financeiros”.
“O cenário segue sendo marcado por expectativas desancoradas”, disse o Copom.
Ao explicar por que decidiu elevar a Selic ao maior patamar em 19 anos, o comitê liderado por Gabriel Galípolo, que foi indicado por Lula, repetiu alertas sobre a política fiscal do governo federal que o Copom fazia na época de Roberto Campos Neto, indicado por Jair Bolsonaro.
“A política fiscal tem um impacto de curto prazo, majoritariamente por meio de estímulo à demanda agregada, e um impacto de médio prazo, que incorpora os efeitos do prêmio a termo da curva de juros. Uma política fiscal que atue de forma contracíclica e contribua para a redução do prêmio de risco favorece a convergência da inflação à meta”, diz a ata do Copom, que segue:
“Assim, o debate mais recente, com ênfase na dimensão estrutural do orçamento fiscal e na redução ao longo do tempo de gastos tributários, tem potencial de afetar a percepção sobre a sustentabilidade da dívida e de ter impactos sobre o prêmio da curva de juros.”